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A beleza do engenho em Camões: um poema antitético analisado por suas unidades.

setembro 5, 2010

Amor é fogo que arde sem se ver

Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Luis Vaz de Camões.

Não há quem resista à beleza e a profundidade deste soneto, ele flutua por tantas dimensões que de alguma forma ele desperta a sensibilidade por todos os elementos que o constitui. Paradoxalmente, ele tem uma estrutura complexa e é escrito sobre diversos fragmentos precisamente situados para capturar o leitor.

Ele como todos os poemas excedem a situações de belo, devem ser lidos, comentados, analisados, aferidos, interpretados, sentidos, absorvidos pelos diversos aspectos que a sua leitura revela.

Tentemos analisar os versos pela sua tonicidade e padrões de rimas.

Amor é fogo que arde sem se ver

A/ mor/ é/ fo/ go/ que ar*/ de/ sem/ se/ ver,

Este verso pode ser definido como pentâmetro jambico, ainda que a sinérese de tonicidade ascendente* não seja matéria pacífica na versificação. Explora a cadência binária desenhando um ritmo marcado onde os efeitos da aliteração /r/ proporcionam a fluência que a declamação pede neste primeiro verso.

Quanto ao estilo atentemos para a comparação que ele realiza de uma das características do fogo para depois negá-la na segunda metade do verso, o fogo que arde no amor é invisível.

*Sinérese de tonicidade ascendente – Neste exemplo a partícula “que” átona, herda parte da tonicidade da sílaba “ar” de ‘arde’ descrevendo uma duração maior para a prolação e tornando-se desta forma tônica.
é/ fe/ ri/ da/ que/ dói,/ e/ não/ se/ sen/ te;

Aqui temos o primeiro padrão desta estrofe, o substantivo “amor” está elidido e a dor do amor encontra-se subjacente a felicidade que a sua vivencia promete.

A parte estilística realiza o segundo padrão nesta estrofe uma antítese sofisticada, uma dor insensível, quase um paradoxo.
é/ um/ con/ ten/ ta/ men/ to/ des/ con/ ten/ te,

Este verso apresenta uma construção sofisticada do ritmo, apesar das tônicas mais evidentes realizarem o padrão de um decassílabo heróico as subtônicas reforçam a construção binária do ritmo, uma característica dos poetas que compõe de ouvido.

Quanto ao estilo os paralelos prosseguem e aqui se realizam num paradoxo traduzindo toda a carga antitética deste poema.
é/ dor/ que/ de/ sa/ ti/ na/ sem/ do/er*.

O ritmo repete a realização do verso anterior. A realização estilística saiu do paradoxo anterior para realizar uma comparação e assim descrever a irracionalidade material da dor de amor. É necessário temer a dor que enlouquece, desatina, ainda que não doa.

Lancemos um último olhar para a realização que esta estrofe pretende.

Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

O padrão das rimas é interpolado ABBA, em versos agudos (oxítonos) e graves (paroxítonos) numa estrutura anafórica.

O que costuma escapar aos leitores menos atentos nesta estrofe é a elisão do substantivo amor, elidido na estrutura anafórica, mas realizando a condição de substantivo, detalhe capital para a situação do poema.

É/ um/ não/ que/ rer/ mais/ que/ bem/ que/ rer;

O ritmo conforma-se dentro do padrão já determinado na estrofe anterior, com tonicidade marcante na abertura do verso e um decréscimo bem ajustado em polissíndeto pela partícula “que”; reparem três tônicas e a primeira partícula, duas tônicas e a segunda partícula e finalmente as duas ultimas tônicas dentro do mesmo padrão.
é/ um/ an/ dar/ so/ li/ / rio/ en/ tre a/ gen/te;

Permanece o padrão rítmico e os paralelos antitéticos na parte estilística. Quanto a versificação há encontros vocálicos que admitem a elisão e um hiato que não admite, que anoto apenas para reforçar as condições que possibilitam a assimilação de outra sílaba.
é/ nun/ ca/ con/ ten /tar/ -se/ de/ con/ ten/ te;

O padrão rítmico vem sendo mantido estilisticamente repete-se a figura do terceiro verso da primeira estrofe, anote, porém, que neste verso há uma inversão provocada por uma incapacidade aguda de preencher as demandas do amor mesmo quando ele se realiza.
é/ um/ cui/dar/ que/ ga/nha em/ se/ per/der.

O ritmo segue impecável e a condução estilística neste verso consolida pela utilização arbitrária dos verbos para construir uma poderosa antítese.

Analisando a estrofe:

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

Permanece o padrão interpolado para as rimas e versos.

O substantivo “amor” que se encontrava elidido na anáfora anterior flexiona para a forma “amar” mudando a situação de sujeito para estado.

Predomina nesta estrofe a realização semântica, amar é um desvario, pois cada verso pode ser traduzido pela intensidade e excessos. Duas negativas, não e nunca se alternam com paradoxos resultando numa superposição antitética que constrói o nexo do poema.

É/ que/ rer/ es/ tar/ pre/ so/ por/ von/ ta/de;

O ritmo é uma constante e os paralelos seguem conformando a antítese.
é/ ser/ vir/ a/ quem/ ven/ ce, o/ ven/ ce/ dor;

Este ponto do poema realiza uma preciosa lição da conformação semântica, a figura do vencedor está semanticamente obstruída e de difícil definição pelo que o poeta anotou. A tensão semântica é tal que o premio para vencedor e vencido é o mesmo e a identidade de amante e amado se confunde nesta difusão.

A antítese realizada com a licença de uma anástrofe imperfeita, mas adequadamente aplicada para a imagem produzida pelo verso.
é/ ter/ com/ quem/ nos/ ma/ ta,/ le/ al/ da/ de.

Os leitores mais atentos ao ritmo perceberão o uso ostensivo das tônicas no pé de abertura deste verso realizando uma catarse rítmica pela declamação das aliterações /m/ e /d/ que acrescenta o contraste entre “nos mata” e “lealdade”.

Analisando a estrofe:

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

“Amar” segue elidido, pois a construção semântica está calcada no estado, a estrutura anafórica se mantém; há recursos de construção presente nos dois últimos versos, artesanalmente trabalhados para estabelecer o preâmbulo que sua ultima unidade exige.
Mas/ co/ mo/ cau/ sar/ po/ de/ seu/ fa/ vor

O ritmo do poema tem a sua condução alterada, inicia o verso numa sílaba fraca e com sonoridade uniforme, a inversão “de causar pode” desacelera a cadência declamatória rompendo definitivamente com o padrão de sonoridade, neste ponto é a captura semântica que se sobrepõe para fechar o poema. A nota quanto ao estilo é a supressão da força antitética desenvolvida até aqui trazendo a atenção para a superfície do poema.
nos/ co/ ra/ ções/ hu/ ma/ nos/ a/ mi/ za/ de,

Permanece o ritmo pausado do verso anterior estabelecendo um nível menor de tensão que exige complementação no último verso. Estilisticamente segue o abandono a antítese.
se/ tão/ con/ trá/ rio a/ si/ é o/ mes/ mo A/ mor?

O ritmo retorna a cadência binária, apesar da tônica em sétima. Considerando aspectos de versificação há duas elisões a primeira prece conflitar com o exemplo no verso seis, mas o hiato absorve pacificamente a vogal numa supressão de gênero, a segunda elisão é típica, nada a comentar.

Semanticamente este verso retoma as antíteses e num movimento de contração finda num falso questionamento, pois o que deveria ser a dúvida na verdade é a explicação para o que parece inquirir, fechando de forma soberba as antíteses.

Analisando a estrofe:

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Os recursos mais notados na construção desta estrofe apontam para o propósito semântico, estilisticamente o poema abandona a estrutura anafórica e veste uma superfície quase denotativa, não fosse seu ultimo verso.

O ritmo binário retorna somente no último verso mostrando claramente o propósito catártico da indagação final, numa contração construída nos dois versos anteriores.

A realização antitética deste poema é uma das características que sustenta a força com que ele se faz presente em nossas memórias. O eu lírico ao tentar tornar inteligível o que é de natureza sensível percebe-se desprovido de ferramentas expressivas e conduz suas descrições para além do arbítrio das idealizações.

Transitando por imagens e sensações comuns, fogo, dor, solidão; somos conduzidos para o estranhamento dos extremos, finito e infinito, material e espiritual.

A expressão é conduzida ao limite numa tentativa de definir poeticamente a idealização do amor em toda a sua tensão e fragilidade. O itinerário das antíteses leva a duas dimensões distintas e opostas, na primeira estrofe amor é maiúsculo, substantivo corresponde à idealização que perseguimos, mas imperfeitos que somos obtemos dela apenas a manifestação sensível da “dor que desatina” quando de fato, desejamos “que se sente sem doer”.

A segunda estrofe traz o amor na sua manifestação concreta, física, a realização possível do amor, bastante aquém da idealização. Esta tentativa de transpor logicamente a idealização do amor leva a considerações dos extremos e deixando uma série de questões que no final se conformam numa ultima indagação que sintetiza tudo o que o poema buscava expressar.

Há cuidados com a versificação em todo poema, há um nexo em cada unidade que o poema foi dividido, por isso esta forma de analisar, havemos ainda que considerar um vocabulário simples que permite a qualquer leitor adentrar no texto para iniciar o seu processo de leitura.

Apenas para acrescentar novos elementos nesta forma de análise atentemos para as marcas de tempo e espaço deixadas pelo poeta dentro da sua realização, apesar da proximidade que o tempo verbal realiza, a aplicação do verbo no infinitivo transforma o nosso poema numa peça atemporal, coloca amar numa circunstancia infinita e o espaço é a condição humana pela transição de substantivo para verbo onde Amor muda da condição ideal (substantivo) para situação real (verbo).

O ser humano quer o Amor, mas só consegue amar. Esta sentença traduz a condição geral concernente a toda humanidade e recaí sobre a limitação de cada indivíduo, o amor possível.

Está desta forma tudo aí, escrito e descrito no poema.

Notas de Antonio Cândido.

COMENTÁRIOS.

Trata-se de um soneto.

Significativo: adoção de um instrumento expressivo italiano (ou fixado e explorado pelos italianos), apto pela sua estrutura a exprimir uma dialética; isto é, no caso, uma forma ordenada e progressiva de argumentação. Há certa analogia entre a marcha do soneto e a de certo tipo de raciocínio lógico em voga ainda ao tempo de Camões: o silogismo. Em geral, contém uma proposição ou uma série de proposições (ou algo que se pode assimilar a ela) e uma conclusão (ou algo que se pode a ela assimilar).

Este soneto obedece ao modelo clássico. E composto em decassílabos e obedece ao esquema de rimas ABBA, ABBA, CDC, DCD. Isto permite a divisão do tema e a constituição de uma rica unidade sonora, na qual a familiaridade dos sons e a passagem dum sistema de rimas a outro ajuda ao mesmo tempo o envolvimento da sensibilidade e a clareza da exposição poética (proposição, conclusões).

O decassílabo, como aqui aparece, é de invenção italiana, embora exista com outros ritmos na poesia de outras línguas. Verso capaz de conter uma emissão sonora prolongada, e bastante variada para se ajustar ao conteúdo.

Este soneto apresenta uma particularidade: a proposição é feita por uma justaposição de conceitos nos dois primeiros quartetos, estendendo-se ao primeiro terceto. Só nó último tem lugar à conclusão (que é uma conseqüência do exposto), que de ordinário principia no anterior.

Quanto à estrutura rítmica, notar que na parte propositiva (onze versos), todos os versos têm cesura na sexta silaba, permitindo um destaque de dois membros, o primeiro dos quais exprime a primeira parte de uma antítese, exprimindo o segundo a segunda parte. Vemos aqui a função lógica ou psicológica da métrica, ao ajustar-se à marcha intelectual e afetiva do poema.

Note-se ainda que o poeta recorre discretamente à aliteração, isto é, à freqüência num ou mais versos das mesmas consoantes, formando uma determinada constante sonora, ou antes, um efeito sonoro particular: /r/ no primeiro verso; /t/ no terceiro e sétimo; /d/ no quarto; /v/ no décimo, etc.

Quanto a outras circunstâncias exteriores à interpretação, como data de composição, situação na vida do poeta, etc., não há elementos no caso. Apenas um pormenor erudito de variantes.

INTERPRETAÇÃO

Primeira parte: aspecto expressivo formal.

Evidentemente se trata de um poema construído em torno de antíteses, organizadas longitudinalmente em forma simétrica, por efeito da cesura significativa, dando nítida impressão de estrutura bilateral regular, ordenada em torno de uma tensão dialética. São duas séries de membros que se opõem, prolongando durante onze versos um movimento de entrechoque.

Esta forma estrutural geral é movimentada por uma progressão constante do argumento poético, manifestadas inicialmente pelo efeito de acúmulo das imagens, que acabam criando uma atmosfera de antítese; posteriormente pela abstração progressiva das categorias gramaticais básicas, que são no caso vocábulos chaves do ponto de vista poético.

Assim é que temos sucessivamente uma área de substantivos, uma área de verbos substantivados e uma área de verbos.

Substantivos: primeira estrofe: fogo, ferida, contentamento, dor.

Verbos substantivados: segunda estrofe: um querer, um andar (solitário pode ser substantivo ou adjetivo, aliás; dupla leitura possível). Transição no terceiro verso que prepara a passagem para a área seguinte verbal (/um/ nunca contentar-se).

Verbos: terceira estrofe, e já fim da segunda: querer estar, servir, ter.

Trata-se de um nítido processo de abstração, que revela a passagem do estado passivo do sujeito poético à sua ação, intensificando a sua força emocional. Ainda sob este aspecto, note-se na área dos substantivos a evolução da causa material – fogo – para a conseqüência material imediata e apenas metaforicamente imaterial – ferida, – e dela para a conseqüência imaterial mediata – contentamento e dor, que são estados da sensibilidade.

Na última estrofe, a cesura* não divide o verso, há transposição (“enjam-bement**”, e todo o terceto se apresenta como unidade expressiva coesa e ininterrupta, pela presença de uma conseqüência lógico-poética, sob a forma de interrogação. Esta interrogação exprime a perplexidade do poeta e permite transitar à nossa segunda parte. (Ver nota abaixo).

Segunda parte: aspecto expressivo existencial.

Este soneto exprime, sob aparente rigidez lógica, uma densa e dramática tensão existencial; é o encerramento de uma profunda experiência humana, baseada na perplexidade ante o caráter contraditório (bilateral, para usar a expressão aplicada à forma estrutural do soneto) da vida humana.

A vida é contraditória, e como os poetas não cansam de lembrar, amor e ódio, prazer e dor, alegria e tristeza, andam juntos. Sabemos hoje pela psicologia moderna que isto não constitui, para a ciência, motivo de perplexidade, mas a própria realidade dos sentimentos de toda a personalidade. A arte percebeu antes da ciência.

No soneto de Camões há uma rebeldia apenas retórica, sob a perplexidade do último terceto. Mas no corpo dialético do poema reponta uma aceitação das duas metades da vida, pelo conhecimento do seu caráter inevitável.

A profunda experiência de um homem que viveu guerras, prisão, vícios, gozos do espírito, leva-o a esta análise que reconhece a divisão na unidade. E a própria conclusão perplexa do fim é o reconhecimento de que a unidade se sobrepõe afinal à divisão do ser no plano da experiência humana total. O amor é tudo o que vimos, e ele é aspiração de plenitude graças à qual o nosso ser se organiza e se sente existir. Grande mistério – sugere o poeta – que sendo tão aparentemente oposto à unidade do ser, ele seja um unificador dos seres (na medida em que é amizade).

A simetria antitética perfeitamente regular exprime a presença de uma ordem no caos. O espírito unifica no plano da arte as contradições da vida, não as destruindo, mas integrando-as.

Nota: Seria possível representar graficamente o soneto de Camões, levando em conta a estrutura antitética das três primeiras estrofes, cortadas verticalmente pela cesura no 6a verso, e o ritmo unificador da estrofe final.

Cesura* – Corte ou pausa que se observa como elemento estrutural de certos versos, separando-lhe os membros métricos ou hemistíquios.

Enjambement** – O mesmo que cavalgamento; fenômeno que se verifica quando o sentido de uma frase é interrompido no  final de um verso e vai completar-se no outro.

Candido, Antonio – O Estudo Analítico do Poema. Humanitas, 1996.

Campos, Geir – Pequeno Dicionário de Arte Poética. Cultrix, 1978.

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Análise Literária do Soneto “Braços” de Cruz e Souza.

novembro 13, 2009

João da Cruz e Souza nasceu em 24 de novembro de 1861 em Desterro, hoje Florianópolis, Santa Catarina. Seu pai e sua mãe, negros puros, eram escravos alforriados pelo Marechal Guilherme Xavier de Sousa. Ao que tudo indica o Marechal gostava muito a família, pois o menino João da Cruz recebeu, além de educação refinada, adquirida no Liceu Provincial de Santa Catarina, o sobrenome Sousa.

Apesar de toda essa proteção, Cruz e Souza sofreu com o preconceito racial. Depois de dirigir um jornal abolicionista, foi impedido de deixar sua terra natal por motivos de preconceito racial.

Algum tempo depois foi nomeado promotor público, porém,  impedido de assumir o cargo, novamente por causa do preconceito. Ao transferir-se para o Rio, sobreviveu trabalhando em pequenos empregos e continuou sendo vítima do preconceito.

Cruz e Souza morreu em 19 de março de 1898 na cidade mineira de Sítio, vítima de tuberculose. Suas únicas obras publicadas em vida foram Missal e Broquéis.

Cruz e Souza é, sem sombra de dúvidas, o mais importante poeta Simbolista brasileiro, chegando a ser considerado também um dos maiores representantes dessa escola no mundo. Muitos críticos chegam a afirmar que se não fosse a sua presença, a estética Simbolista não teria existido no Brasil. Sua obra apresenta diversidade e riqueza.

De um lado, encontram-se aspectos noturnos, herdados do Romantismo como, por exemplo, o culto da noite, certo satanismo, pessimismo, angústia morte etc. Já de outro, percebe-se certa preocupação formal, como o gosto pelo soneto, o uso de vocábulos refinados, a força das imagens etc.

Em relação a sua obra, pode-se dizer ainda que ela tenha um caráter evolutivo, pois trata de temas até certo ponto pessoais como, por exemplo, o sofrimento do negro e evolui para a angústia do ser humano.

Broquéis é um livro de poesia maior. O Simbolismo nele refulge na sua linguagem colorida, exótica e vigorosa; na abstração vaga e diluída de toda a materialidade; na imprecisa, mas dominante tendência mística, envolvendo todo um vocabulário litúrgico; na linguagem figurada, constantemente fórica, de aliterações e sinestesias; na crescente musicalidade que emana de seus versos. São poemas simbolistas, mas poemas carregados de sentimento e de vivências vigorosas. Poemas que identificam a tortura existencial do poeta, totalmente dedicado à criação poética.

É de Cruz e Souza o próximo poema a ser analisado.

Braços

Braços nervosos, brancas opulências,
Brumais brancuras, fúlgidas brancuras,
Alvuras castas, virginais alvuras,
Lactescências das raras lactescências.

As fascinantes, mórbidas dormências
Dos teus abraços de letais flexuras,
Produzem sensações de agres torturas,
Dos desejos as mornas florescências.

Braços nervosos, tentadoras serpes
Que prendem, tetanizam como os herpes,
Dos delírios na trêmula coorte…

Pompa de carnes tépidas e flóreas,
Braços de estranhas correções marmóreas,
Abertos para o Amor e para a Morte!

Cruz e Souza.

Breve glossário.

Opulência: Magníficas, abundantes, pomposas;

Brumais: Nevoeiros;

Nervosos: Excitado, vigoroso, enérgicos;

Fúlgidas: Brilhantes, que tem fulgor,

Alvuras: Qualidade de alvo, pureza, candura;

Castas: Inocente, pura, que preserva a castidade;

Virginais: Próprio de virgens;

Lactescências: Detém propriedades semelhantes ao leite;

Raras: Incomum, excêntricos, extravagante;

Mórbidas: Doentio, enfermo, lânguido;

Dormências: Quietação, insensibilidade parcial, torpor físico,

Letais: Relativo à morte, lúgubre, fatídico;

Flexuras: Articulações, meneios, frouxidão;

Agres: Azedo, Acre;

Torturas: Tortuosidade, curvatura, suplício;

Morna: Tépido, insípido, sem energia;

Florescência: Que floresce, ornado de flores, brilhante, próspero, notável;

Serpes: Serpentes;

Tetanizam: Afetados pela tetania, acometidos por contrações musculares, (neologismo);

Delírios: Perturbação inconsciente, exaltação do espírito, alucinação, entusiasmo;

Trêmula: Agitar-se, mover tremendo, hesitar, vacilar;

Pompa: Aparato suntuoso, fausto, esplendor;

Coorte: Gente armada, tropa, grupo, multidão, partidários;

Tépidas: Pouco quente, frouxo, tíbio;

Flóreas: Florescentes, florido, viçoso, belo;

Correções: Retificação, castigo, aperfeiçoamento, perfeição, pureza, lisura;

Marmóreas: Como o mármore, que tem alguns atributos do mármore, cor, frio, dureza.

Analisemos a pauta rítmica do poema:

Forma: Soneto – Versos Decassílabos em todo o poema, estrutura
rítmica variada, resgate de ritmos que a escola anterior havia abandonado ritmos medievais. Versos compostos de dois hemistíquios, a maioria deles sendo um verso com duas redondilhas menores independentes; ocorrência de enjambement em cinco versos.

1)Primeira Estrofe

Acentos  Hemistiquios (Hs)

Bra/ços/ ner/vo/sos/,  bran/cas/ o/pu/n/cias, =             1/4/6/10
1   2      3    4    5      6      7  8   9   10
Bru/mais/ bran/cu/ras/, fúl/gi/das/ bran/cu/ras,             2/4/6/10.
1      2       3     4   5     6   7    8     9     10
Al/vu/ras/ cas/tas/, vir/gi/nais/ al/vu/ras,                       2/4/8/10
1     2   3    4    5      6   7    8    9   10
Lac/tes/cên/cias/ das/ ra/ras/ lac/tes/cên/cias. ?             3/6/10  Hs unidos com preposição
1      2    3    4       5    6   7     8   9    10                                                                              .

2) Segunda Estrofe

As/ fas/ci/nan/tes/, mór/bi/das/ dor/mên/cias        4/6/10
1       2  3   4    5      6     7   8     9     10
Dos/ teus/ a/bra/ços/ de/ le/tais/ fle/xu/ras,            2/4/8/10    Hs  unidos com preposição
1       2     3   4    5     6   7   8     9   10
Pro/du/zem/ sen/sa/ções/ de a/gres/ tor/tu/ras,      2/6/8/10    Hs  enjambement
1      2    3    4     5    6       7        8       9   10
Dos/ de/se/jos/ as/ mor/nas/ flo/res/cên/cias.           3/6/10     Hs enjambement
1       2   3   4    5     6    7      8    9    10

3) Terceira estrofe – Primeiro Terceto

Bra/ços/ ner/vo/sos/, ten/ta/do/ras/ ser/pes                1/4/8/10
1      2     3     4   5          6    7  8   9      10
Que/ pren/dem/, te/ta/ni/zam/ co/mo os/ her/pes,      2/6/8/10  Hs unidos enjambement
1      2       3      4   5  6   7     8       9        10
Dos/ de/li/rios/ na/ trê/mu/la /co/or/te…                    3/6/10 – intersecção de hemistiquios
1     2   3  4     5    6     7   8   9   10                                                enjambement

4) Quarta estrofe – Segundo Terceto

Pom/pa/ de/ car/nes/ /pi/das/ e /fló/reas,                  1/4/6/10
1      2    3    4    5     6   7   8    9  10
Bra/ços /de es/tra/nhas/ co/rre/ções/ mar//reas,     1/4/8/10
1      2       3      4    5      6    7    8      9     10
A/ber/tos/ pa/ra o A/mor/ e /pa/ra a/ Mor/te!          2/4/6/8/10   Hs unidos  enjambement
1    2    3    4       5      6     7   8   9     10

Nenhum é puramente sáfico ou heróico (sáfico 4/8/10 e heróico 6/10)
A partir do Renascimento, por influência italiana, houve uma tendência de fixação das formas acentuadas na 6ª e 1Oª sílabas (decassílabo heróico) e na 4ª, 8ª  e 10ª sílabas

A pauta rítmica é sofisticada, habilmente construída para estabelecer
esta difusão, esta ambigüidade entre sáficos e heróicos estabelecendo uma cadencia de leitura agradável e fluída, predomina uma atenção relacionada a musicalidade do texto, uma característica marcante no poeta.

Recursos fônicos: Ocorrências vocálicas

Encontros intravocabulares – encontros intervocabulares –

Diérese/hiatização/intra

Braços nervosos, brancas opulências,
Brumais brancuras, fulgidas brancuras,
Alvuras castas, virginais alvuras,
Lactescências das raras lactescências.

As fascinantes, mórbidas dormências
Dos teus abraços de letais flexuras,
Produzem sensações de agres torturas, Sinalefa -ditongação
Dos desejos as mornas florescências.

Braços nervosos, tentadoras serpes
Que prendem, tetanizam como os herpes,  Crase
Dos delírios na trêmula coorte…

Pompa de carnes tépidas e flóreas,
Braços de estranhas correções marmóreas,
Abertos para o Amor e para a Morte! Sinalefa/Elisão e Crase.
Elisão
* pouco uso ocorrências vocálicas, conectivos, conjunções, vocábulos de ligação.

Usa as palavras cheias, na sua maioria, inclusive para passar de um hemistíquio para outro.

Existem os encontros vocálicos do tipo al (auvuras)

Ocorrência de sons de r, s, b, p, d, f, t, m, n, a, o, e

Regularidade métrica – Decassílabos, estrutura rítmica variada

O esquema das rimas é:
abba,
abba,
ccd e
eed.

Que corresponde a emparelhadas interpoladas, com rimas graves, ou seja, versos onde predominam paroxítonas no final e rimas consoantes apresentam semelhança de vogais e consoantes na sua composição.

Quanto à situação, as rimas são externas, apesar das reiterações e paralelismos permitirem certa ambigüidade.

Todo o poema é dominado por aliterações em S, B, N, T, V, D, R, M e C; assonâncias em e, a e o; que estabelecerá uma sonoridade vibrante e sibilante em sua leitura. A utilização de plural foi uma das principais agentes nesta opção.

As figuras de estilo mais evidentes são as metáforas (v.1 e 2), sinestesia (v. 8 e 5), comparação (v. 10), sinédoque (v.1 e 9) e assíndetos por toda primeira estrofe.

A primeira estrofe desenha em assíndetos uma exortação, onde sucessivas reiterações sobre clareza, pureza, alvura e fulgor entrelaçam com a metáfora “braços nervosos” (v.10), anote-se um único substantivo, um artigo preposicionado e todo o mais adjetivos, alguns reiterados, provocando um efeito sintático/semântico comum no poeta.

A segunda estrofe tem seus dois versos iniciais anotando a decadência física, “mórbidas dormências” (v.5) até as “letais flexuras” (v.6). Os dois versos seguintes constroem um paralelismo entre dor e prazer, registradas através das sensações, daí em diante o paralelismo preponderará na leitura.

O primeiro terceto aborda os atributos de sedução, na figura da serpente, reafirmando o desejo tal uma doença “tetanizam como os herpes” (v.10); o último verso deste terceto faz uma referencia a escolha, a pele partidária do desejo, há o paralelismo febre/paixão.

Há uma flagrante relação sensual entre desejo e morte, desde “braços nervosos, brancas opulências” (v.1) em “abertos para o Amor e para a Morte” (v.14).

O segundo terceto aborda em seu primeiro verso o amor sensual, a ambigüidade de “correções marmóreas” (v.13), pela sinestesia, conduz a imagem de braços que expressam, abraça até a postura final diante da morte.

Consideremos o nível léxico, o poeta se expressa através de linguagem culta e sofisticada. Nota-se uma restrição na utilização dos verbos, apenas três, um deles, “tetanizam”, neologismo e uma proposta de elaboração de uma peça reflexiva, lidando com imagens abstratas e considerações íntimas do autor.

Observando o nível sintático, é bastante pronunciado os paralelismos apoiados nas reiterações, o tempo verbal utilizado, presente, busca estabelecer uma proximidade com o leitor.

Esta é uma primeira leitura, linear, que diz até onde o poema alcança; porém o poema também é o poeta e braços traz uma referencia direta a cor branca em toda a sua primeira estrofe que conflita na pele do poeta. Haverá coincidência?

Braços realizam trabalhos, que sempre lhe fora negado, apesar de todos os atributos resultantes de sua formação.

A morte e o amor estão intrínsecos em todo o poema, como na vida do poeta.

Como o livro Broquéis, esta é uma representação bastante vigorosa do simbolismo no Brasil. O trabalho de um poeta singular que, postumamente, alcançou mérito e acrescentou um valor relevante a literatura brasileira.

A poesia de Cruz e Sousa mantém a estrutura formal típica do Simbolismo, uso de sonetos, rimas ricas, etc., mas em um tom mais musical, rítmico, com uma variedade de efeitos sonoros, uma riqueza de vocabulários, e um precioso jogo de correspondências, sinestesias, contrastes e antíteses.

Transparece a preocupação social, onde a dor do homem negro é fruto de suas próprias experiências de preconceito, funde-se à dor universal humana, conferindo à sua obra um tom filosófico que reflete a angústia, o pessimismo e o tédio. A solução é sempre a fuga, a preferência pelo místico, a busca pelo mundo espiritual que o consola.

É o eterno conflito entre o real e o irreal dentro do universo humano, os mistérios de Deus e do homem, da vida e da morte que convivem com o amor, o misticismo, e os desejos. O resultado é sempre o sofrimento do ser, muitas vezes personificado pela dor do preconceito, o que leva aos ideais abolicionistas dentro de sua obra.

Em contraste com a cor negra, está o uso de um vasto vocabulário relacionado à cor branca: neve, espuma, pérola, nuvem, brilhante, etc. Isso reflete sua obsessão, tipicamente simbolista, pela imprecisão, pelo vago, a pureza e o mistério.

Sua obra ainda é vastamente tomada pela sensualidade, pela busca da auto-afirmação e pela subjetividade, indicada no uso constante da primeira pessoa, pelo culto à noite, pela busca do símbolo e do mistério da existência, através de uma imagem obscura, sugerida e distorcida.

É considerado por muitos como um dos maiores poetas simbolistas do mundo, com uma qualidade literária muito próxima a dos melhores poetas simbolistas franceses, como Mallarmé.

Alguns aspectos foram reservados para análises futuras, devido à necessidade de ordenar a matéria apresentada, outros foram tratados superficialmente para abordagem mediante debate no próprio tópico, caso haja algo mais a considerar, sendo matéria de minha atenção retornamos para comentar em seguida.

Esta análise, como as demais, não se pretende absoluta; seguramente haverá ambigüidades ou informações refutáveis, mas sempre abertas ao questionamento, correção e debate.

Aproveito para agradecer o empenho da Recantista Diana Gonçalves pela co-autoria na análise e coleta de informações durante o processo; a contribuição preciosa da Nilza Azzi nos ajustes e dúvidas que foram se apresentando durante o percurso.

Dudu Oliveira.

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Análise Literária do Soneto “Oficina Irritada” de Carlos Drummond de Andrade.

novembro 13, 2009

Oficina Irritada – Análise Literária do poema de Carlos Drummond de Andrade.

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira do Mato Dentro – MG, em 31 de outubro de 1902. De uma família de fazendeiros em decadência, estudou na cidade de Belo Horizonte e com os jesuítas no Colégio Anchieta de Nova Friburgo RJ, de onde foi expulso por “insubordinação mental”. De novo em Belo Horizonte, começou a carreira de escritor como colaborador do Diário de Minas, que aglutinava os adeptos locais do incipiente movimento modernista mineiro.

Ante a insistência familiar para que obtivesse um diploma, formou-se em farmácia na cidade de Ouro Preto em 1925. Fundou com outros escritores A Revista, que, apesar da vida breve, foi importante veículo de afirmação do modernismo em Minas. Ingressou no serviço público e, em 1934, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde foi chefe de gabinete de Gustavo Capanema, ministro da Educação, até 1945.

Passou depois a trabalhar no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e se aposentou em 1962. Desde 1954 colaborou como cronista no Correio da Manhã e, a partir do início de 1969, no Jornal do Brasil.

O modernismo não chega a ser dominante nem mesmo nos primeiros livros de Drummond, Alguma poesia (1930) e Brejo das almas (1934), em que o poema-piada e a descontração sintática pareceriam revelar o contrário. A dominante é a individualidade do autor, poeta da ordem e da consolidação, ainda que sempre, e fecundamente, contraditórias.

Torturado pelo passado, assombrado com o futuro, ele se detém num presente dilacerado por este e por aquele, testemunha lúcida de si mesmo e do transcurso dos homens, de um ponto de vista melancólico e cético. Mas, enquanto ironiza os costumes e a sociedade, asperamente satírico em seu amargor e desencanto entrega-se com empenho e requinte construtivo à comunicação estética desse modo de ser e estar.

Vem daí o rigor, que beira a obsessão. O poeta trabalha, sobretudo com o tempo, em sua cintilação cotidiana e subjetiva, no que destila do corrosivo. Em Sentimento do mundo (1940), em José (1942) e, sobretudo em A rosa do povo (1945), Drummond lançou-se ao encontro da história contemporânea e da experiência coletiva, participando, solidarizando-se social e politicamente, descobrindo na luta a explicitação de sua mais íntima apreensão para com a vida como um todo. A surpreendente sucessão de obras-primas, nesses livros, indica a plena maturidade do poeta, mantida sempre.

Porém é com Claro Enigma de 1951 que Drummond consolida a sua estética, e expressa os vazios do mundo moderno e do homem contemporâneo. Um livro rigoroso desde o apuro da versificação, passando pelas intertextualidades mais flagrantes as citações veladas; Drummond revela nesta obra as raízes e as ramificações de sua lira, até a liberdade consumada no rigor que amparou a clareza de sua lírica.

Neste Drummond há versos secos vasculhando o vazio dos sentimentos interditados, uma nostalgia lisboeta numa citação simbolista e uma ponte entre dois bardos num único soneto, por tudo que registra e pelo poeta que se depura Claro Enigma é trabalho de carpintaria, como diria Saramago.
Várias obras do poeta foram traduzidas para o espanhol, inglês, francês, italiano, alemão, sueco, tcheco e outras línguas. Drummond foi seguramente, por muitas décadas, o poeta mais influente da literatura brasileira em seu tempo, tendo também publicado diversos livros em prosa.

Em mão contrária traduziu os seguintes autores estrangeiros: Balzac (Les Paysans, 1845; Os camponeses), Choderlos de Laclos (Les Liaisons dangereuses, 1782; As relações perigosas), Marcel Proust (La Fugitive, 1925; A fugitiva), García Lorca (Doña Rosita, la soltera o el lenguaje de las flores, 1935; Dona Rosita, a solteira), François Mauriac (Thérèse Desqueyroux, 1927; Uma gota de veneno) e Molière (Les Fourberies de Scapin, 1677; Artimanhas de Scapino).

Alvo de admiração irrestrita, tanto pela obra quanto pelo seu comportamento como escritor, Carlos Drummond de Andrade morreu no Rio de Janeiro RJ, no dia 17 de agosto de 1987, poucos dias após a morte de sua filha única, a cronista Maria Julieta Drummond de Andrade.

Vem da exasperação de Drummond a próxima análise literária:

Oficina Irritada

Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.

Quero que meu soneto, no futuro,
não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

Esse meu verbo antipático e impuro
há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.

Ninguém o lembrará: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

Carlos Drummond de Andrade

Oficina Irritada

Eu/ que/ro/ com/por/ um/ so/ne/to/ du/ro  (H)
co/mo/ po/e/ta al/gum/ ou/sa/ra es/cre/ver. (H)
Eu/ que/ro/ pin/tar/ um/ so/ne/to es/cu/ro, (P)
se/co, a/ba/fa/do,/ di//cil/ de/ ler. (M)

Que/ro/ que/ meu/ so/ne/to,/ no/ fu/tu/ro, (H)
não/ des/per/te em/ nin/guém/ ne/nhum/ pra/zer. (H)
E/que,/ no/ seu/ ma/lig/no ar/ i/ma/tu/ro,  (H)
ao/ mes/mo/ tem/po/ sai/ba/ ser,/ não/ ser. (P)

E/sse/ meu/ ver/bo an/ti//ti/co e im/pu/ro (M)
há/ de/ pun/gir,/ / de/ fa/zer/ so/frer, (S)
ten/dão/ de/ /nus/ sob/ o/ pe/di/cu/ro. (H)

Nin/guém/ o/ lem/bra/:/ ti/ro/ no/ mu/ro, (H)
cão/ mi/jan/do/ no/ caos,/ en/quan/to Arc/tu/ro, (H)
cla/ro e /nig/ma,/ se/ dei/xa/ sur/preen/der. (H)

Carlos Drummond de Andrade

Observando a escansão constatamos versos decassílabos heróicos, sáficos, pentâmetro e moinheira, meticulosamente ordenados para os efeitos propostos para o poema.

Os versos quatro e nove são decassílabos em moinheira, exatamente nas descrições mais agudas do poema: “seco, abafado, difícil de ler. (v.4) e Esse meu verbo antipático e impuro (v.9). Tal situação se deve a anotação rítmica da tensão poética que neste expediente confere um alto nível de consciência e domínio da versificação na variação do ritmo do poema.

Há na estrofação um esquema de rimas binário com alternâncias de graves e agudas em rimas alternadas. Esta opção restringe a leitura para uma sonoridade previsível, não há a variação nos tercetos que distende a leitura e permite alterar o andamento. Nota-se a intenção de provocar o leitor gerando uma leitura restritiva, aonde o nexo do poema vai se fechando nos tercetos e o último verso ironiza num oximoro.

Considerando o desenvolvimento estilístico a primeira estrofe anota anáfora em “Eu quero” no primeiro e terceiro verso, ainda na primeira estrofe sinestesia em: duro, pintar, escuro, seco e abafado.

A situação semântica criada nesta estrofe é a expressão de um desejo do eu lírico, provavelmente o mesmo soneto lido pelo leitor. Os versos três e quatro denunciam as restrições que o eu lírico pretende impor ao leitor, um texto fechado em oposição a exploração contemporânea do soneto.

O verso cinco reitera a anástrofe apesar da elisão do pronome: “(Eu) Quero que meu soneto, no futuro,” e reafirma o desejo consciente que impulsiona o poema, o verso seguinte anota o abandono da gratuidade estética e preconiza em reiteradas negativas (não, ninguém e nenhum) a obstrução do prazer.

Esta estrofe traz ainda um componente que acrescenta dolo à consciência do eu lírico, ao evocar um “maligno ar imaturo” e fecha numa ligação com Sheakspeare: “ao mesmo tempo saiba ser, não ser.” (v.8).

A grande metáfora da estrofe é que o poema alcance o futuro, e que o prazer estético possa estar contido na essência do poema, que seja na forma e no conteúdo e todos os leitores possam tê-lo; o ser e não ser.

O primeiro terceto confronta as opções do eu lírico diante de um padrão de beleza, Vênus a versão romana para a deusa da beleza, o poeta é o pedicuro que deveria cuidar da beleza da Vênus e opta por impingir sofrimento a beleza no seu labor.

O último terceto é um trabalho de elevado nível de realização:

Ninguém o lembrará: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

O poeta tem todos os recursos disponíveis para perseguir este intento, abrindo a palavra ao mundo fantástico e para ao absoluto; mostrando que a língua não é apenas um sistema (para isto até outro Sol, Arcturus, a guardiã das ursas, é evocado) e que a realidade e riqueza interior do sujeito consciente podem não se submeter a nenhum enclausuramento limitante que a expressão estruturante do sentido possa sugerir.

A pretensão de criar uma atmosfera de rara preciosidade, distante das preocupações rasteiras do cotidiano, mostra-se efetiva através do impacto profundo que causa: na grande estrela de Arcturus, surpresa, no vulgo, sofrimento. Só existe beleza na ordem (expressa por Vênus), mas o impulso da oficina busca ainda mais distante e primevo: o caos, também

um deus mitológico, cuja figuração inusitada no poema rompe a rotina, trazendo a estranheza.

As rupturas que podem alterar o cotidiano e a nossa forma de ver os fenômenos terminam por fundar uma nova ordem, uma superestrutura sobre os escombros do status quo, a novidade substitui a figura, não liberta.

O tiro no muro é um ruído que assusta, mas não mata enquanto o cão mijando no caos é a consciência desconhecendo qualquer ordem.

Arcturus é o novo sol, como Horus, e tudo que o zeitgeist indica como divindade, um atavismo confessional, a divinação da nova ordem, o novo dogma que o oximoro “Claro enigma põe a nu numa sentença bastante sofisticada: “se deixa surpreender.”

Arcturus é ainda a ligação com o outro bardo Camões em Os Lusíadas – Canto I, na invocação dos Deuses.

Há neste soneto uma exasperação em relação ao ideário contemporâneo e o vazio da estética despida de sentidos, o poeta sugere um exame na ordem das coisas e cobra responsabilidade na condução do verso, e não por acaso convoca os bardos para o seu verso.

 

Dudu Oliveira.

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Análise Literária do Soneto “Quando olho para mim não me percebo” de Álvaro de Campos.

novembro 13, 2009

Fernando Antonio Nogueira Pessoa nasceu em 1888, em Lisboa, aí morreu em 1935, e poucas vezes deixou a cidade em adulto, mas passou nove anos da sua infância em Durban, na colônia britânica da África do Sul, onde o seu padrasto era o cônsul Português.

Pessoa, que tinha cinco anos quando o seu pai morreu de tuberculose, tornou-se um rapaz tímido e cheio de imaginação, e num estudante brilhante.

Pouco depois de completar 17 anos, voltou para Lisboa para entrar na universidade, que cedo abandonou, preferindo estudar por sua própria conta, na Biblioteca Nacional, onde leu sistematicamente os grandes clássicos da filosofia, da história, da sociologia e da literatura (portuguesa em particular) a fim de completar e expandir a educação tradicional inglesa que recebera na África do Sul.

A sua produção de poesia e de prosa em Inglês foi intensa, durante este período, e por volta de 1910, já escrevia também muito em Português. Publicou o seu primeiro ensaio de crítica literária em 1912, o primeiro texto de prosa criativa (um trecho do Livro do Desassossego) em 1913, e os primeiros poemas em 1914.

Vivendo por vezes com parentes, outras vezes em quartos alugados, Pessoa ganhava a vida fazendo traduções ocasionais e redação de cartas em inglês e francês para firmas portuguesas com negócios no estrangeiro.

Embora solitário por natureza, com uma vida social limitada e quase sem vida amorosa, foi um líder ativo do movimento Modernista em Portugal, na década de 10, e ele próprio inventou vários movimentos, incluindo um “Interseccionismo” de inspiração cubista e um estridente e semi futurista.

Pessoa manteve-se afastado das luzes da ribalta, exercendo a sua influência, todavia, através da escrita e das tertúlias com algumas das mais notáveis figuras literárias portuguesas. Respeitado em Lisboa como intelectual e como poeta, publicou regularmente o seu trabalho em revistas, boa parte das quais ajudou a fundar e a dirigir, mas o seu gênio literário só foi plenamente reconhecido após a sua morte.

No entanto, Pessoa estava convicto do próprio gênio, e vivia em função da sua escrita. Embora não tivesse pressa em publicar, tinha planos grandiosos para edições da sua obra completa em Português e Inglês e, ao que parece, guardou a quase totalidade daquilo que escreveu.

Em 1920, a mãe de Pessoa, após a morte do segundo marido, deixou a África do Sul de regresso a Lisboa. Pessoa alugou um andar para a família reunida – ele, a mãe, a meia irmã e os dois meios irmãos – na Rua Coelho da Rocha, nº 16, naquela que é hoje a Casa Fernando Pessoa.

Foi aí que Pessoa passou os últimos 15 anos da sua vida – na companhia da mãe até a morte desta, em 1925, e depois com a meia irmã, o cunhado e os dois filhos do casal (os meios irmãos de Pessoa emigraram para a Inglaterra).

Familiares de Pessoa descreveram-no como afetuoso e bem humorado, mas firmemente reservado. Ninguém fazia idéia de quão imenso e variado era o universo literário acumulado no grande baú aonde ele ia guardando os seus escritos ao longo dos anos.

O conteúdo desse baú – que hoje constitui o Espólio de Pessoa na Biblioteca Nacional de Lisboa – compreende os originais de mais de 25 mil folhas com poesia, prosa, peças de teatro, filosofia, crítica, traduções, teoria lingüística, textos políticos, horóscopos e outros textos sortidos, tanto dactilografados como escritos ou rabiscados ilegivelmente à mão, em Português, Inglês e Francês.

Pessoa escrevia em cadernos de notas, em folhas soltas, no verso de cartas, em anúncios e panfletos, no papel timbrado das firmas para as quais trabalhava e dos cafés que freqüentava, em sobrescritos, em sobras de papel e nas margens dos seus textos antigos. Para aumentar a confusão, escreveu sob dezenas de nomes, uma prática – ou compulsão – que começou na infância.

Chamou de heterônimos aos mais importantes destes “outros”, dotando-os de biografias, características físicas, personalidades, visões políticas, atitudes religiosas e atividades literárias próprias.

Algumas das mais memoráveis obras de Pessoa escritas em Português foram por ele atribuídas aos três principais heterônimos poéticos – Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos – e ao “semi-heterônimo” Bernardo Soares, enquanto que a sua vasta produção de poesia e prosa em Inglês foi, em grande parte, creditada aos heterônimos Alexander Search e Charles Robert Anon, e os seus textos em francês ao solitário Jean Seul.

Os seus muitos outros alter-egos incluem tradutores, escritores de contos, um crítico literário inglês, um astrólogo, um filósofo e um nobre infeliz que se suicidou. Havia até um seu “outro eu” feminino: a corcunda e perdidamente enamorada Maria José.

No virar do século, sessenta e cinco anos depois da morte de Pessoa, o seu vasto mundo literário ainda não está completamente inventariado pelos estudiosos, e uma importante parte da sua obra continua à espera de ser publicada.

Álvaro de Campos (1890 – 1935) é um dos mais conhecidos heterônimos de Fernando Pessoa. Foi descrito biograficamente por Pessoa: “Nasceu em Tavira, teve uma educação vulgar de Liceu; depois foi mandado para a Escócia estudar engenharia, primeiro mecânica e depois naval. Numas férias fez a viagem ao Oriente de onde resultou o Opiário. Agora está aqui em Lisboa em inatividade.”

Vanguardista e cosmopolita, refletindo nos poemas em que exalta em tom futurista, a civilização moderna e os valores do progresso. Um estilo torrencial, amplo, delirante e até violento, a civilização industrial e mecânica, como expressa o desencanto do quotidiano citadino, adotando sempre o ponto de vista do homem da cidade.

Campos procura incessantemente sentir tudo de todas as maneiras, seja a força explosiva dos mecanismos, a velocidade, seja o próprio desejo de partir.

Fonte: Casa Fernando Pessoa.

É Fernando Pessoa através de Álvaro de Campos o poeta visitado nesta analise:

Quando olho para mim não me percebo.

Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.

O ar que respiro, este licor que bebo,
Pertencem ao meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.

Nem nunca, propriamente reparei,
Se na verdade sinto o que sinto. Eu
Serei tal qual pareço em mim? Serei

Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.

Álvaro de Campos por Fernando Pessoa

Quando olho para mim não me percebo.

01- Quan/do o/lho/ pa/ra/ mim/ não/ me/ per/ce/bo. (H)
02- Te/nho/ tan/to a /ma/ni/a/ de/ sen/tir (H)
03- Que/ me ex/tra/vio/ às/ ve/zes/ ao/ sa/ir (H)
04- Das/ pró/prias/ sen/sa/ções/ que/ eu/ re/ce/bo.(H)

05- O ar/ que/ res/pi/ro, es/te/ li/cor/ que/ be/bo,(S)
06- Per/ten/cem/ ao/ meu/ mo/do/ de e/xis/tir, (H)
07- E eu /nun/ca/ sei /co/mo hei/ de/ con/clu/ir (H)
08- As/ sen/sa/ções/ que a/ meu/ pe/sar/ con/ce/bo.(H)

09- Nem/ nun/ca,/ pro/pria/men/te/ re/pa/rei, (H)
10- Se/ na/ ver/da/de/ sin/to o/ que/ sin/to. Eu (H)
11- Se/rei/ tal/ qual/pa/re/ço em/ mim?/ Se/rei (P)

12- Tal/ qual/ me/ jul/go/ ver/da/dei/ra/men/te? (T)
13- Mes/mo an/te as/ sen/sa/ções/ sou um/ pou/co a/teu, (H)
14-Nem/ sei/ bem/ se/ sou/ eu/ quem/ em/ mim/ sen/te.(H)

Inicialmente, o ritmo, a utilização de um metro decassílabo com a predominância de heróicos e a inclusão outros tipos de verso no mesmo metro, conferem a este poema uma leitura rítmica uma leitura original.

O verso cinco é um sáfico registrando tensão poética numa expressão de sinestesia; o verso sete realiza uma curiosa elisão prolongando uma átona, mas devido o deslocamento da tônica, deve ser considerado um verso moderno, quase um transgressor, ainda neste verso, tensão poética e paronomásia que dão a sustentação que a ausência (?) da tônica em sexta poderia exigir.

O verso onze é um pentâmetro que acentua a oitava criando uma parelha para o curioso verso doze, o verso doze é um achado, é um sáfico moderno, sua oitava é subtônica e a declamação pede esta acentuação, apesar da consideração gramática; eis aí uma licença poética, no estrito rigor do termo.

As aliterações são ricas e elabora uma sofisticada declamação, as consoantes /q/ /p/ /t/ /v/ /z/ e /d/ proporcionam uma dicção pontuada, que reforça as pausas e reforçam as tônicas, principalmente nos peônios de quarta pela distancia máxima entre tônicas.

As assonâncias obedecem ao mesmo critério é necessário atentar para a situação dos hiatos, reforçando as pausas nos pés onde eles ocorrem. Predominam as vogais /a/ /e/ /i/ e /o/; atentemos para as parelhas internas das estrofes e o efeito da assonância em /i/, conjugado a uma rima aguda, conferindo uma sugestão de verso mais curto ao impor uma declamação mais dinâmica.

Quanto ao esquema de rimas, vale a percepção da alternância de rimas graves e agudas, obedecendo às parelhas interpoladas, tanto nos quartetos como as alternadas nos tercetos. A utilização equilibrada das oxítonas e paroxítonas, por todo poema, confere uma declamação de andamento oscilante, que torna a leitura dinâmica e reflexiva em consonância com a temática existencial abordada no poema.

As formas verbais, todas no presente, dão a correta distancia confidencial que o poema registra. A seleção vocabular denuncia alguns aspectos já cotejados nas criações do poeta, uma preocupação em sentir, ou entender o que sente; eis daí a reiteração de “sensações” e do verbo “sentir” no curso do poema.

O último terceto é uma constatação da incredulidade como opção consciente de si, abre com um questionamento sobre verdade divaga sobre a própria consciência até o ponto onde o eu lírico desdenha mesmo da idéia que possa ter de si. Há a utilização deliberada da sonoridade “em” por todo último verso, como um eco que denuncia um vazio, um acento quase simbolista não fosse a acidez do eu lírico nesta última estrofe.

Há poucas referencias concretas no poema, mesmo a sinestesia encontra-se expressa no verso cinco quase que exclusivamente, logo a sensibilidade está presa a dimensão que o eu lírico não reconhece, uma representação de si mesmo a reproduzir as reações conhecidas, como uma vontade sem autonomia.

Este poema tem uma particularidade semântica que o destaca das realizações mais triviais, apesar da leveza dos seus versos as figuras de estilo foram delineadas na estrofe, como uma idéia maior e mais complexa, forçando o leitor a guardar alguma distancia para capturar as indagações de cada estrofe.

As antíteses complexas e os paralelos da primeira estrofe colocam no mesmo plano excesso e falta, de tanto sentir-se o eu lírico se perde das sensações que recebe…

A segunda estrofe reitera e abre a metáfora para a impossibilidade de “concluir”, assimilar, as sensações recebidas. O primeiro terceto traz o desvendamento da questão, até que ponto o eu lírico não é apenas uma circunstancia de uma época, a replicação de um costume, a fundação de uma virtude, um conceito; no meio de tudo isto haverá alguém?
Alguma real identidade?

Ao evocar a verdade e sustentar-se no credo, fica a nu o paradigma que deve reinar sobre todos; o referencial de verdade e credulidade está confinado na sublimação da autonomia, então o eu lírico retorna a constatação do primeiro verso sem fé, sem verdade e sem identidade.

Álvaro de Campos é a superfície desassombrada de Fernando Pessoa, a temática existencial, a narrativa elíptica e o domínio rigoroso da confecção do verso permitiu a este heterônimo construir versos modernos sem refutar as realizações clássicas.

Certamente há mais para falar sobre esta realização, porém o propósito desta análise é introduzir a atenção leitora para as dimensões do texto poético.

Seja quanto à estrutura sintática, a utilização de recursos estilísticos, o nível léxico, a fluência declamatória realizada pela estruturação fônica, a realização semântica e o domínio das competências de versificação.
Observando rigorosamente os elementos acima destacados, notamos a singularidade de Pessoa e a genialidade na evolução emancipada de seus heterônimos.

Dudu Oliveira.

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Análise Literária de Soneto de Gregório de Matos.

novembro 13, 2009

Poeta baiano (1633-1696). Considerado um dos escritores mais originais da língua portuguesa no século XVII durante o período barroco. Gregório de Matos Guerra nasce em Salvador. De família rica e proprietária de engenho, entre 1652 e 1661 estuda direito na Universidade de Coimbra, em Portugal, onde faz carreira como jurista.

Volta ao Brasil em 1682 e é nomeado tesoureiro-mor da Sé, na Bahia, depois de ordenado clérigo tonsurado – grau de iniciação nas ordens sacras que prevê a tonsura, corte de cabelo em formato de coroa típico dos prelados da época.

Por se recusar a vestir batina é destituído do posto em 1683. Passa a viver da advocacia e a escrever sua obra satírico-erótica, que retrata a sociedade baiana da época. Seus poemas, de forte inspiração clássica, denunciam a ganância e a busca do prazer pelos poderosos. Por isso, ganha o apelido de Boca do Inferno. Leva vida boêmia até ser deportado para Angola, em 1694.

Torna-se conselheiro do governador Henrique Jaques Magalhães na colônia portuguesa e, como compensação pelos serviços prestados, autorizado a retornar ao Brasil, passa a viver no Recife, onde morre. Sua poesia sobrevive graças a manuscritos apócrifos.

É publicado pela primeira vez em 1831, numa coletânea organizada por Januário da Cunha Barbosa chamada Parnaso Brasileiro ou Coleção das Melhores Poesias dos Poetas do Brasil, Tanto Inéditas como Já Impressas.

É do “Boca do Inferno” a próxima análise literária.

Soneto.

Neste mundo é mais rico, o que mais rapa:
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa:
Com sua língua ao nobre o vil decepa:
O Velhaco maior sempre tem capa.

Mostra o patife da nobreza o mapa:
Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa
Quem menos falar pode, mais increpa:
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa.

A flor baixa se inculca por Tulipa;
Bengala hoje na mão, ontem garlopa:
Mais isento se mostra, o que mais chupa.

Para a tropa do trapo vazo a tripa,
E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa.

Gregório de Matos.

Gregório de Matos apresenta alguns aspectos particulares que demandariam uma atenção mais demorada, a sua lírica se dividiu em três interesses distintos, o amor, a filosofia e a religião.

Porém o Gregório destas anotações é o poeta degredado, o satírico, que pela sua crítica a sociedade e aos costumes da Bahia colonial, onde o “Boca do Inferno” apontava sua pena contra os mandatários da metrópole, tornou-se a primeira referencia do Barroco brasileiro.

A sátira constitui a parte mais original da poesia de Gregório de Matos, pois se desvincula dos padrões vigentes na descrição formal do Barroco e atenta para a realidade baiana do século XVII.

Há uma relação direta com a realidade e com o Brasil, numa crítica direta a situação de exploração colonial empreendida pela política portuguesa.

Observando o soneto, construído em decassílabos heróicos e sáficos, com um vocabulário, popular e chulo, que conferem a sua execução uma comunicação original e inaugura uma relação de meta linguagem pela transgressão temática do soneto, nestas terras.

Há palavras que necessitam de alguma investigação pela sua ocorrência rara nos nossos dias.

Glossário

Carepa: caspa, sujeira;
Vil: ordinário;
Increpar: censurar, repreender;
Garlopa: ferramenta de marcenaria, termo usado como sinônimo de trabalho braçal.

Um soneto com desenvolvimento temático expressivo, com referenciais de superfície claros, e de fácil abordagem. O ritmo e a sonoridade são explorados com habilidade, de modo que aliterações em /m/, /s/ e /p/ e assonâncias em  /a/, /e/ e /o/ fluem naturalmente na leitura do poema.

A desenvoltura na construção dos paralelos é facilitada pelo confronto de “mais” e “menos” em todo poema, os advérbios são aplicados para dar uma situação de imutabilidade para a ação (v.10), que a forma verbal anotada no presente constrói o que ocorre agora, ocorre desde sempre, denuncia o eu lírico.

O soneto é uma crônica dos costumes na Bahia colonial com a diferença de tratamento entre os mandatários e o povo.  Há uma referencia histórica a tulipamania, que estava em vigor nos Países Baixos e deu a esta flor um valor inexplicável naquele período.

Lido unidade a unidade notaremos o tema desenvolvido de maneira crítica até o primeiro terceto, quando assume o seu tom satírico e realiza as sugestões chulas e encerra o poema com um verso inusitado.

Atentando para a meta linguagem é possível perceber a crítica ao esvaziamento da temática pelos poetas contemporâneos de Gregório de Matos, o esquema rítmico e as rimas são uma provocação aos poetas do período.

A forma utilizada e a execução das suas unidades de nexo levam a crer num embate entre as idealizações formais dos seus pares e a expressividade radical cultivada pelo poeta.

A riqueza da construção semântica confere alto valor a este poema, as antíteses realizando os paralelos e anotando os contrastes entre rico e pobre, moral e amoral vai estabelecendo a tensão que se cumpre na síntese do ultimo terceto (v.12), onde o eu lírico “vaza a tripa”, uma expressão chula, e deixa sugerida a intenção da musa num verso onomatopaico.

A sátira é parte da poesia, inúmeros poetas realizaram textos satíricos, de Bocage a Manuel Bandeira, o singular em Gregório de Matos é a sua maneira de manipular a língua, sem proselitismo, apropriando-se de termos populares e chulos; conferindo ao uso da língua um atributo de comunicação e confrontando o elemento de segregação contido nas representações formais do idioma.

Dudu Oliveira.

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Análise Literária do poema “A Máquina do Mundo” de Carlos Drummond de Andrade.

novembro 11, 2009

 

 

No ano de mil novecentos e cinqüenta e um, o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade trouxe a luz o que seria considerado por muitos como o seu livro mais importante: Claro Enigma.

Neste volume o poeta retoma a construção dos versos clássicos e por meio de intertextualidades exalta os grandes poetas da língua. Se o volume como um todo é uma relação direta com Mensagem de Fernando Pessoa, a pedra de toque é o poema A máquina do mundo numa conexão direta com Os Lusíadas, de Camões, especificamente o canto décimo.

Tantos aspectos tornaram este poema o exemplar mais eloqüente da poética drummondiana, ao ponto de receber da imprensa especializada o título de poema mais importante escrito no Brasil no século vinte.

Para alguns pode parecer excessiva tamanha importância, contudo, o objetivo desta breve análise é apresentar alguns dos elementos que conferiram tal mérito a esta execução sem paralelo na literatura brasileira.

Quanto à forma empregada, terza rima, há uma conexão direta com Dante em Divina Comédia, onde tal estrutura atingiu a plenitude na execução.

Os decassílabos de Drummond são toantes e dentro desta estrutura iremos identificar um rigoroso exercício de criação, com as suas partes semânticas claramente delineadas, numa circularidade concêntrica, onde a gravidade esta no atavismo existencialista de cumprir uma existência sem razão ou propósito.

Ao evocar os poetas fortes em sua realização Drummond assume conscientemente a relevância da sua poesia, ao retomar a formulação clássica dos versos dá uma lição preciosa ao mundo modernista, onde a opção é construída no domínio de determinado modus, enquanto os modernistas propunham em alguns radicalismos a ignorância da execução clássica.

Claro Enigma textualmente é um oximoro, destes que açulam a atenção pelo potencial que a proposta comunica, e tratando-se de Drummond há que atentar para os círculos que o poeta desenha em sua própria obra e o quanto a máquina do mundo reconhece Drummond no meio do caminho.

O desafio é comentar e relacionar este poema, cuja força impressiona e catequiza poetas e críticos a mais de cinqüenta anos, e que como todo poema forte, promove uma reflexão acerca do homem, da linguagem e do seu tempo.

 

A Máquina do Mundo.

 

E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
“O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste… vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que tantos
monumentos erguidos à verdade;

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mão pensas.

 

Carlos Drummond de Andrade.

 

Alguns comentários sobre a forma são necessários, apenas para situar a sua realização dentro do espaço tempo, utilizando dos versos decassílabos clássicos em rimas toantes, de tal forma que a tensão poética realizada pela alternância métrica dilui a formalidade declamatória conferindo ao poema um curso mais reflexivo e profundo, o ritmo delineia em pausas sem os maneirismos sonoros.

As anotações léxicas são exuberantes, as palavras transitam em registros denotativos e conotativos dirigindo a consciência do leitor para dentro do poema; a aplicação livre dos vocábulos expandindo o seu emprego formal conduz o leitor para uma dimensão incomum na cena poética em que este poema se realizou.

Diferente do experimentalismo disfarçado de arrojo nas execuções concretistas, Drummond restabelece a conexão do nexo com a linguagem, onde a natureza semântica denotativa paira no verso sem obscurecer a realização conotativa que a construção do verso referencia.

Há uma intertextualidade direta com a Divina Comédia, desde a caminhada do eu lírico que busca a situação do homem, espiritualmente, em Dante, e existencialmente em Drummond e ainda na forma conscientemente semelhantes; no entanto, Dante traça seu itinerário em espiral parte do incerto, atravessa a escuridão e alcança a iluminação numa reiteração da ascendência virtuosa. Dentro dos modelos que o seu poema projeta.

Drummond opta por um itinerário diverso, a circularidade, onde cada verso estabelece um retorno dentro do tema e se fecha como unidade autônoma, é nesta circunstancia que no final de seu itinerário o poeta abraça o ceticismo e contesta as representações de assunção contidas na obra de Dante.

A precisa aplicação dos recursos sintáticos esclarece que o pretendente a poeta, não verá a luz com domínio parcial da gramática, a crítica menos efusiva trata a execução sintática como obra de carpintaria, tal o rigor empregado, o uso e as soluções dentro dos elementos de expressão poéticas aplicados como recurso sintático.

Alguns vocábulos menos freqüentes, ganham o valor de neologismo conservando o curso semântico do verso, sem aprisionar as interpretações a essência vernacular.

Os aspectos semânticos desdobram-se na execução de um poema de curso simples onde o eu lírico caminha por uma estrada e em sua jornada depara com uma máquina que representa uma poderosa metáfora de consciência, linguagem e transcendência.

As divagações que sucedem registram um cético diante da representação limitada da realidade contaminada por valores que não dialogam plenamente dentro do seu tempo, o poeta ao final de sua jornada rejeita a máquina e segue deprimido pela sua inadequação.

Um eu lírico que não conforma além da aspiração determinada em seu espaço como ocorrera com Dante, Pessoa e Camões.

Os recursos estilísticos através das figuras de tropos e construção conferem um brilho impar, é necessário atentar para a circularidade habilmente construída, onde o corpo do poema se molda na grande metáfora que todo poema pretende, sem, contudo abandonar a anáfora e a epanástrofe que se insinua a todo tempo na estrutura da obra.

O que confere a esta realização esta deferência é sua transcendência da realização artística para a questão filosófico-existencial, aonde um poeta maduro conduz o eu poético por realizações universais em uma temática desafiadora, que exige experiência e sensibilidade para moldar sua expressão sem estabelecer juízos.

O poema termina na lassidão, no abandono de um ser que não conforma nas idealizações vigentes e não arroga sua inquietação como uma angústia do seu tempo.

Há ainda muito a se dizer sobre este texto, cada aspecto deve ser confrontado com o que o influenciou e o que ainda segue influenciando, porém a proposta era de apresentar um poema forte e iniciar uma observação mais atenta aos valores que ele consolidou.

Convém saber que sua força é tal que ele se desdobrou numa realização do poeta concretista Haroldo de Campos que ele nominou A máquina do mundo repensada, que é uma proposta importante para ler este poderoso poema e inventariar a sua importância cinqüenta anos depois de escrito.

 

Dudu Oliveira.

 

 

 

 

 

 

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Violoncelo – Analise Literária de poema de Camilo Pessanha.

agosto 12, 2009

Camilo Pessanha (Coimbra, sete de setembro de 1867 — Macau, 1º de Março de 1926) foi um poeta português, expoente máximo do Simbolismo.

Tirou o curso de Direito em Coimbra. Em 1894, transferiu-se para Macau, onde, durante três anos, foi professor de Filosofia Elementar no Liceu de Macau, deixando de lecionar por ter sido nomeado em 1900, conservador do registro predial em Macau e depois juiz de comarca. Entre 1894 e 1915 voltou a Portugal algumas vezes, para tratamento de saúde, tendo, numa delas sido apresentado a Fernando Pessoa que era como Mário de Sá-Carneiro, grande apreciador da sua poesia.

Publicou poemas em várias revistas e jornais, mas seu único livro Clepsidra (1920), foi publicado sem a sua participação (pois se encontrava em Macau) por Ana de Castro Osório, a partir de autógrafos e recortes de jornais. Graças a essa iniciativa, os versos de Pessanha se salvaram do esquecimento.

Posteriormente, o filho de Ana de Castro Osório, João de Castro Osório, ampliou a Clepsidra original, acrescentando-lhe poemas que foram encontrados. Essas edições saíram em 1945, 1954 e 1969. Apesar da pequena dimensão da sua obra, é considerado um dos poetas mais importantes da língua portuguesa.

Foram os seus poemas simbolistas que largamente influenciaram a geração de Orpheu, desde Mário de Sá Carneiro até Fernando Pessoa. Sua poesia mostrava o mundo sob a ótica da ilusão, da dor e do pessimismo. O exílio do mundo e a desilusão em relação à Pátria também estão presentes em sua obra e passam a impressão de desintegração do seu ser. A sua obra mais famosa é Clepsidra, relógio de água, que contém a reunião de seus poemas com musicalidade marcante e temas até certo ponto dramáticos, publicado em 1922.

Camilo Pessanha que é, sem sombra de dúvidas, o maior e mais autêntico poeta Simbolista português foi fortemente influenciado pela poesia de do poeta francês Verlaine.

O poeta foi acometido de tuberculose retornando a Portugal por várias vezes para tratar de sua saúde. Essas viagens de pouco valeram, uma vez que o poeta faleceu em 1º de março de 1926 em Macau após o agravamento da doença, causado provavelmente pelo vício ao ópio.

É de Camilo Pessanha o próximo poema visitado:

Violoncelo

Chorai arcadas
Do violoncelo,
Convulsionadas.
Pontes aladas
De pesadelo…

De que esvoaçam,
Brancos, os arcos.
Por baixo passam,
Se despedaçam,
No rio os barcos.

Fundas, soluçam
Caudais de choro.
Que ruínas, (ouçam)
Se se debruçam,
Que sorvedouro!

Trêmulos astros,
Soidões lacustres…
Lemes e mastros…
E os alabastros
Dos balaústres!

Urnas quebradas.
Blocos de gelo!
Chorai arcadas
Do violoncelo,
Despedaçadas…

Camilo Pessanha

Glossário:

Arcadas – Corrida do arco sobre as cordas do instrumento.

Convulsionadas – Pôr em convulsão, Fig. Excitar; agitar; Revolucionar.

Avoaçam – Esvoaçar.

Caudais – Relativo à cauda; Da cauda; Torrencial; Caudalosa.

Debruçam – Colocar-se de bruços; Inclinar-se.

Sorvedouro – Voragem onde a água faz remoinho; Precipício; abismo.

Trêmulos -. Que treme; Bruxuleante; Tímido; hesitante; indeciso; Tremido na voz ou no canto; Efeito produzido pelos instrumentos de corda multiplicando com grande rapidez as vibrações sobre a mesma nota; Efeito produzido no piano por duas notas ou dois acordes diferentes, feridos alternadamente e com grande rapidez; Conjunto de pedras preciosas que formam flores, oscilando nas extremidades de pequenos arames.

Soidões – Solidões;

Lacustres – De lago; dos lagos; Geol. Diz-se dos terrenos depositados no fundo das águas doces.

Alabastro – Espécie de mármore branco, translúcido, pouco duro e susceptível de um belo polido.

Balaústre – Colunelo ou pequeno pilar que, geralmente com outros, sustenta um peitoril ou corrimão.

Urna – Vaso, de forma variável, que servia aos Antigos para guardar as cinzas dos mortos, recolherem água das fontes, etc.

Anotarei a seguir alguns comentários sobre o ritmo:

O poeta utiliza em sua composição versos isométricos de quatro sílabas poéticas, num pé composto, antipasto, tônicas em primeira e quarta; com rimas perfeitas, regulares e graves.

O metro curto em estrofes de cinco versos com esquema ABAAB exalta o ritmo quebrado e soluçante do texto poético.

As figuras sonoras: aliteração bastante pronunciada de forma a criar uma harmonia musical nos versos, principais consoantes aplicadas; /s,/r, /d, /m/ e /t; assonâncias fundadas na aplicação as seguintes vogais, /a, /e/ e /o/.

A utilização predominante de paroxítonas em um metro par proporciona uma marcha de leitura, suave e cadenciada, a exceção da aliteração em /t, consoante linguodental explosiva, as outras ocorrências sonoras colaboram com uma fluência leitora musical uma das características marcantes desta corrente literária.

Realizando as anotações semânticas do poema, nos veremos diante da alma da criação, baseado em comparações apoiadas em contigüidades e figurações sinestésicas, Pessanha construiu um dos marcos do simbolismo português.

As metáforas sucedem na desconstrução do concreto, dispensando a denotação e sugerindo mediante as figuras de expressão os significados que o leitor deve alcançar.

Pessanha não faz concessões para uma leitura confortável, ele eleva o seu leitor à condição de conquistador, ao desfigurar o denotativo do poema a alternativa que resta ao leitor é a intuição e o tirocínio para realizar as relações mínimas que o texto impõe.

Violoncelo

Chorai arcadas – Apóstrofo/Metáfora
Do violoncelo,
Convulsionadas. – Prosopopéia
Pontes aladas – Alegoria
De pesadelo…

De que esvoaçam, – Alegoria/Sinestesia
Brancos, os arcos. – Sinestesia
Por baixo passam, – Anacoluto
Se despedaçam,
No rio, os barcos. – Anástrofe

Fundas, soluçam – Anástrofe/ Sinestesia
Caudais de choro. – Alegoria/Sinestesia
Que ruínas, (ouçam) – Sinestesia
Se se debruçam,
Que sorvedouro!

Trêmulos astros, – Metáfora
Soidões lacustres… Metonímia
Lemes e mastros…
E os alabastros
Dos balaústres!

Urnas quebradas.
Blocos de gelo! – Sinestesia
Chorai arcadas – Apóstrofo/Metáfora
Do violoncelo,
Despedaçadas…

A música do violoncelo provoca um estado de espírito ansioso, uma sensação de mistério e tristeza; mas este sentimento não é capturado notadamente, é apenas sugerido por uma série de imagens e associações. O eu poético não esclarece que a tristeza, esta ansiedade ou inquietude esteja relacionada à música saída do violoncelo, mas logo a apostrofe “chorai arcadas” nos revela o caráter triste da música.

O poema assenta numa intuição associativa que liga o som grave do violoncelo ao sentimento de dor e de mistério. “Arcadas” designa o movimento do arco sobre as cordas, e ainda o sentido de arcarias. “Arcadas”, por associação trouxe a imagem de “pontes” que também são “arcadas”.

A música no seu gemer contínuo, evoca um curso de água; a ligação ondulante dos versos das duas primeiras estrofes relaciona de forma objetiva, um curso de água. Os adjetivos “convulsionadas” e “aladas” vêm dar a “pontes” a sugestão do arco que voa e provoca o vibrar das cordas. “De pesadelo” vem acentuar o movimento febril e ansioso que se inicia com os adjetivos anteriormente citados.

Na segunda estrofe, já se fala dos “arcos”, das “pontes”. Atentemos para a analogia e contínua associação de palavras e conceitos: tal como arco sobre as cordas; também as pontes “aladas” e os seus arcos “esvoaçam”, até que a sensação do rio corrente nos aparece mais clara: “Por baixo passam, /Se despedaçam, /No rio, os barcos.”

Acentua-se agora mais a impressão da tristeza, “Chorai arcadas” repete-se, intensificado em “fundos soluçam”. Não só o sentido do verbo é mais forte e os timbres mais escuros, mas também o modo do verbo se modificou acentuando agora realidade presente avassaladora do som.

Há a impressão de que a noite paira na poesia: já se não vêm arcadas brancas na ponte, nem barcos passando; ficou apenas o rio agora transformado em caudal. É impossível uma localização fixa no espaço e no tempo; as correlações e analogias produzem apenas a inexorável sensação do fluir.

As arcadas foram primeiro do violoncelo, depois arcos de pontes e agora são de novo o correr do arco sobre as cordas donde brotam caudais de música triste (choro).

A poesia carrega-se mais de amargura: “Que ruínas (ouçam) /Se se debruçam,/ Que sorvedouro!” As imagens vão-se alterando ao sabor do movimento do poema: as “pontes convulsionadas”, os “barcos despedaçados” repetem-se noutras imagens, ilustrando melhor a impressão do estalar do coração na visão das “ruínas”. Uma sensação de distancia, profundidade, engrandece a idéia de “caudal” e enquadra-se no sentido profundo de todo o poema. Subitamente, o movimento parece afrouxar. As frases perdem o verbo e suprimem a ação e afigura-se que os arcos deixaram de correr sobre as cordas, que a música vai desaparecendo.

“Trêmulos astros” é uma imagem nova, uma sugestão de luz que surgiu por contraste com o tom escuro da estrofe precedente e com as “solidões lacustres”. Agora já não é um caudal que passa, são lagos que alastram ermos, escuros… As ruínas arrastadas no caudal vieram dar ao lago escuro: “lemes e mastros”, restos de barcos despedaçados; como se o violoncelo evocasse em nosso espírito as quilhas, as cordas, os cabos dos navios…

A idéia de ruína intensifica-se ainda; “E os alabastros /Dos balaústres! / Urnas quebradas / Blocos de gelo…” tudo isto nos sugere a idéia de brancura, de fragmentação de coisas brancas, a idéia de uma acrópole destruída, e, por cima deste cemitério imenso e solitário, o poeta gostaria de ouvir uma música apropriada, saída de um instrumento também em ruínas (sempre a associação): “Chorai Arcadas, /Despedaçadas, / Do violoncelo”.

É preciso entrar atento no mundo poético de Pessanha para que os seus poemas não pareçam como um caos de frases absurdas. As imagens constantes, as lúcidas conotações e associações são o segredo da unidade do poema. Pessanha é extremamente sensível à luminosidade e ao som, daí as sinestesias freqüentes. Os estímulos sensoriais combinam-se, aproveitam-se mutuamente para produzirem, neste poema, a impressão de água corrente, de ruínas, dos destroços: “Fundas, soluçam/ Caudais de choro/ Que ruínas (ouçam). Constroem sensações visuais: “fundas”, “caudais”, “ruínas”; constrói sensações auditivas: “soluçam”, “choro”, “ouçam”. “Ouçam ruínas” é uma sinestesia que nos sugere não apenas as ruínas em si, mas também o cataclismo que as provocou.

Para fechar esta análise e realizar uma leitura mais completa deste poema único em sua realização e seus efeitos, convém anotar, o isolamento de Pessanha em Macau, a relação que os Portugueses têm com o mar e o que representou para o seu povo as conquistas de além-mar, para o país e para o seu povo.

Ofereço ainda como subsídio para uma análise de maior profundidade, uma anotação de intertextualidade entre Pessanha e Verlaine:

Chanson d’automne.

Les sanglots longs
Des violons
De l’automne
Blessent mon coeur
D’une langueur
Monotone.

Tout suffocant
Et blême, quand
Sonne l’heure,
Je me souviens
Des jours anciens
Et je pleure

Et je m’en vais
Au vent mauvais
Qui m’emporte
Deçà, delà,
Pareil à la
Feuille morte.

Paul Verlaine.

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Vandalismo.

junho 18, 2009

Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos nasceu no Estado da Paraíba em mil oitocentos e oitenta e quatro e faleceu em mil novecentos e catorze aos vinte e nove anos. Publicou um único livro de poesias, intitulado “Eu”.

Sua obra reflete a superação das velhas concepções poéticas e a procura de um novo caminho. Utilizou em sua poesia, e sua temática mais comum sempre gira em torno da morte, da decomposição da matéria, dos vermes e de uma visão trágica sobre a existência.

A próxima análise contempla um conhecido soneto deste grande poeta:

 

Vandalismo

 

Meu coração tem catedrais imensas,

Templo de priscas e longínquas datas.

Onde um nume de amor, em serenatas,

Canta a aleluia virginal das crenças.

 

Na ogiva fúlgida e nas colunatas,

Vertem lustrais irradiações intensas

Cintilações de lâmpadas suspensas

E as ametistas e os florões e as pratas.

 

Como os velhos Templários medievais,

Entrei um dia nessas catedrais

 E nesses templos claros e risonhos…

 

E erguendo os gládios e brandindo as hastas,

No desespero dos iconoclastas,

Quebrei a imagem dos meus próprios sonhos!

 

Vandalismo – Escansão e Esquema Rítmico.

 

Meu-co-ra-ção-tem-ca-te-drais-i-men-sas,

1       2  3   4    5     6   7  8       9 10        ER 4-8-10 S

Tem-plos-de-pris-cas-e-lon-gín-quas-da-tas.

1       2      3   4     5    6 7    8     9      10  ER 1-4-8-10 S

On-de um-nu-me-de a-mor,-em-se-re-na-tas,

1    2         3    4    5     6        7   8  9   10 ER 3-6-10 H

Can-ta a a-le-lu-ia-vir-gi-nal-das-cren-ças

1      2        3  4  5   6   7  8     9    10         ER 1-4-8-10 S

 

Na o-gi-va-fúl-gi-da e-nas-co-lu-na-tas,

1       2  3   4    5   6     7     8  9  10           ER 2-4-10 S

Ver-tem-lus-trais-ir-ra-dia-ções-in-ten-sas,

1     2      3   4      5  6   7    8      9  10       ER 1-4-8-19 S

Cin-ti-la-ções-de-lâm-pa-das-sus-pen-sas

1     2 3   4     5   6     7    8    9     10         ER 4-6-10 H

E as- a-me-tis-tas-e os-flo-rões-e as-pra-tas.

1      2   3    4   5    6     7    8    9     10      ER 4-8-10 S

 

Co-mo os- ve-lhos- Tem-plá-rios-me-die-vais,

1     2           3   4       5       6    7      8    9   10 ER 1-3-6-10 H

En-trei-um-di-a-nes-sas-ca-te-drais

1    2     3    4  5 6    7     8  9   10                ER 2-4-6-10 H

E-nes-ses-tem-plos-cla-ros-e-ri-so-nhos…

1  2     3   4      5      6   7    8  9 10              ER 2-4-6-10 H

 

E er-guen-do os-glá-dios- e -bran-din-do as- has-tas,

1      2       3        4    5       6   7      8     9        10

(ER 2-4-8-10 S)

No-de-ses-pe-ro- dos- i-co-no-clas-tas,

1     2  3    4   5    6     7 8   9   10               ER 4-10 S

Que-brei-a i-ma-gem-dos-meus-pró-prios-so-nhos!

1      2      3    4     5      6      7        8      9  10           

(ER 2-4-8-10 S)

 

As aliterações e assonâncias observadas estrofe a estrofe evidenciam a construção de uma sonoridade grave, devido a constante anotação de M, N,T e D; convém ressaltar a aliteração em S por todo poema,seja no pronome demonstrativo, ou mesmo nos plurais, dando um efeito sibilante na terminação de algumas palavras, conferindo a todo conjunto uma sonoridade particular.

Tomando como ponto de referência as assonâncias, nota-se a utilização da vogal /e/ marcando todo o ritmo e prevalecendo no conjunto de sílabas átonas, ou seja, como pre-tônica, sustentando o ritmo do poema.

As estrofes, quanto às rimas, obedecem a um esquema de emparelhamento interno nos quartetos com polarização para o primeiro e quarto versos; quanto aos tercetos uma parelha nos versos nove e dez e a repetição do esquema dos quartetos nos quatro versos seguintes.

Quanto ao metro, a arquitetura baseia-se no predomínio de decassílabos sáficos nos quartetos, com tensão rítmica no terceiro verso em decassílabo heróico, nos dois quartetos. Os versos dos tercetos são heróicos, integralmente, no primeiro e sáficos no segundo; com um sáfico impreciso no verso treze, que um acento secundário aponta para uma interessante variável, como veremos adiante.

Os aspectos gerais da construção do soneto registram uma apurada atenção na construção dos versos.

As estrofes seguem uma ordenação e tensão, que não se esgota, como é comum na segunda estrofe de sonetos compostos sem considerar o equilíbrio das estrofes, no seu curso rítmico e semântico.

O vocabulário utilizado, onde predominam paroxítonas, é eclético, atende as necessidades de superfície, forma, e as camadas semânticas, sem prejuízo ao nexo ou a fluência da leitura. O poema é expressivo e imagético, registrando a amplificação conotativo-denotativa proposta já no seu primeiro quarteto. Há êxito na construção de imagens e sensações provocando um aguçamento da atenção do leitor pela grande metáfora construída no poema.

A simetria dos dois quartetos com um heróico no terceiro verso irá trazer a tensão que sustentará a unidade das estrofes. As cesuras em quarta dos sáficos distendem-se em sexta nos heróicos dando um curso menos monótono e uma marcha mais elaborada para o poema.

Um exame mais atento mostrará, entretanto, maior complexidade na disposição de sáficos e heróicos; a simetria é apenas nas grandes unidades métricas, comparável à dos compassos musicais. A análise dos elementos componentes de cada verso mostrará a sua diversidade.

Marcando a predominância do ritmo sáfico em toda a composição, a quarta sílaba é tônica em três dos cinco heróicos, excetuam-se desta tonicidade o terceiro e o nono versos, acentuados em terceira, sexta e décima, “onde um nume de amor, em serenata,” e “Como os velhos Templários medievais”. Assim os demais heróicos mantêm em seus segmentos iniciais, ponto de contato com os sáficos, definindo-se, apenas, a contar da tônica em sexta.

No último terceto se estabelece a simetria – o primeiro e o terceiro versos acentuados em segunda, quarta, oitava e décima, separados por um sáfico impreciso – “no desespero dos iconoclastas” – em quarta e décima; o acento secundário reclamado pela extensão do segmento final, tanto pode recair em “dos”, o que o aproximaria do metro heróico, ou em “co” (de iconoclastas), o que o transformaria em sáfico típico. Na verdade, a indecisão rítmica permanece de vez que, por sua menor duração em relação ao primeiro, o acento secundário não tem caráter definitivo.

O poema é em si uma metáfora, onde o coração é o “querer” do poeta, como o amor espiritual, virtuoso e puro como foi expresso na primeira estrofe. A segunda estrofe reitera e detalha estas virtudes onde o “querer” é minuciosamente enunciado com a descrição de um templo grandioso, local de louvor e adoração.

O primeiro terceto representa a paixão como um Templário, uma autoridade dominadora que arrebata e toma a virtude. Os gládios e hastas simbolizam os ímpetos do desejo sobre o amor espiritual idealizado e na “chave de ouro”, prevalece o desejo que submete a paixão.

Vandalismo trata das rupturas internas, dos valores que uma vez idealizados, confrontam no íntimo e o arrebatamento, a paixão, nos leva a uma ruptura para sustentar uma nova ordem. O conflito entre o amor idealizado e o arrebatamento é a figura do Templário e seu poder confessional.

É uma representação profunda para o período que viveu o poeta, num ambiente de amenidades e manifestações idealizadas.

 

Dudu Oliveira.

h1

Análise Literária.

junho 17, 2009

No ano de mil novecentos e cinqüenta e seis, Cecília Meireles lançou um livro de nome Canções. Um livro de poemas elaborados com alguns aspectos já absorvidos da influencia modernista.

É de Cecília Meireles o próximo texto de análise literária.

Canção

Assim moro em meu sonho:
Como um peixe no mar.
O que sou é o que vejo.
Vejo e sou o meu olhar.

Água é o meu próprio corpo,
Simplesmente mais denso.
E meu corpo é minha alma,
E o que sinto é o que penso

Assim vou no meu sonho,
Se outra fui, se perdeu.
É o mundo que me envolve?
Ou sou contorno seu?

Não é noite nem dia,
Não é morte nem vida:
É viagem noutro mapa,
Sem volta nem partida.

O céu da liberdade,
Por onde o coração
Já nem sofre, sabendo
Que bateu sempre em vão.

Cecília Meireles

 

O poema integra o livro Canções, de mil novecentos e cinqüenta e seis, onde a maioria dos textos era composta de versos de cinco sílabas.
Observando as estrofes, estamos diante de uma composição disposta em quadras num esquema rítmico 6(3-6), conforme os versos abaixo:

As – sim – MO – ro em – meu – SO (nho) E.R. 6(3-6)
1      2        3        4             5        6      

Co – mo um – PEI – xe – no – MAR E.R. 6(3-6)
1         2              3      4       5     6   

Quanto à métrica estamos diante de um hexassílabo isométrico ou heróico quebrado, constituído de dois anapestos. 

Explico: Versos de seis sílabas poéticas, tônicas nas posições três e seis.

Adiante no poema constataremos variação na acentuação nos versos cinco, quinze e dezesseis; que será analisado quanto à constituição da tensão rítmica, um dado importante e raramente considerado.

Como a classificação dada ao metro sugere, entendo que estamos diante de um ritmo clássico, que proporciona uma apreciação fluente possibilitando o estabelecimento de tensão rítmica nas variações aplicadas no poema.

A construção da pauta rítmica é importante neste poema, pois ele realiza funções sintáticas e semânticas nas anotações variáveis do ritmo, o que tornará a leitura uma relação de aproximação com a proposta do autor.

 

 

LEVANTAMENTO DAS CONSOANTES

nasais (sonoras)

/m/ oclusiva nasal: 16

/n/ linguodental nasal: 10

/nh/ nasal palatal: 03

fricativas (surdas)

/s/  16

/ss/ 02

/c/ 01

/ç/ 02

oclusivas (surdas)

/p/ 10

/t/ 09

/k/  11

/f/ 02

/x/ 01

oclusivas (sonoras)

/b/ 02 dois últimos versos da última estrofe

/d/ 09

/g/ 01

fricativas (sonoras)

/v/ 09

/j/ 03

laterais

/l/ 01

/lh/ 01

vibrantes

/r/ 15

RESUMO DOS ASPECTOS SELECIONADOS

CONSOANTES SONORAS:

nasais, vibrantes, laterais e outras = 70

nasais = 29 (quase a metade)

CONSOANTES SURDAS:

oclusivas e fricativas = 54

CONSOANTES INTERCALADAS:

próprio – v. 5
simplesmente – v. 6
outra – v. 10
sofre – v. 19
sempre – v. 20

LEVANTAMENTO DAS VOGAIS

VOGAIS NASAIS: 27

VOGAIS ORAIS: 139

DITONGOS ORAIS: 24

DITONGOS NASAIS: 04

Obs: Algumas consoantes estão mais concentradas em algumas estrofes, mas o que mais se destaca, e que está presente em todo o poema, é a nasalização.

LEVANTAMENTO DAS RIMAS

CONSOANTES:

1ª estrofe:

mar/olhar

2ª estrofe

denso/penso

3ª estrofe

perdeu/seu

4ª estrofe

vida/partida

5ª estrofe

coração/vão

TOANTES: não há

Obs: As rimas não estão ausentes. Destaca-se no poema, em todo o seu conjunto, a repetição das palavras de um verso no que se lhe segue.

Destaca-se, em relação às rimas (em final de verso), uma alternância entre paroxítonas e oxítonas.

sonho/mar/vejo/olhar

corpo/denso/alma/penso

sonho/perdeu/envolve/seu

dia/vida/mapa/partida

liberdade/coração/sabendo/vão

UMA FORMA DE COLHER MAIS ELEMENTOS PODE SER
O LEVANTAMENTO POR ESTROFES

Estrofe I

Assim moro em meu sonho:
Como um peixe no mar.
O que sou é o que vejo.
Vejo e sou o meu olhar.

Vogais:35
Consoantes: 24
Nasais: 7

Consoantes

Fricativas surdas: 4
Oclusivas surdas: 5

Nasal palatal: 1
Linguodental nasal: 1
Oclusivas nasais:5
Fricativas sonoras: 4
Laterais vibrantes: 3

Lateral: 1

Vogais:35

Ditongos orais: 5

Vogais orais:31
Vogais nasais: 4

Estrofe II

Água é o meu próprio corpo,
Simplesmente mais denso.
E meu corpo é minha alma,
E o que sinto é o que penso

Consoantes: 32
Nasais: 7

Consoantes

Fricativas surdas: 6
Oclusivas surdas: 9

Nasal palatal: 1
Linguodental nasal: 0
Oclusivas nasais: 6
Fricativas sonoras: 0
Oclusivas sonoras: 2
Laterais vibrantes: 4

Lateral: 0

Vogais: 41

Ditongos orais: 5

Vogais orais:36
Vogais nasais: 5

Consoantes intercaladas: 3

Estrofe III

Assim vou no meu sonho,
Se outra fui, se perdeu.
É o mundo que me envolve?
Ou sou contorno seu?

Consoantes: 25
Nasais: 6

Consoantes

Fricativas surdas: 6
Oclusivas surdas: 5

Nasal palatal: 1
Linguodental nasal: 2
Oclusivas nasais: 3
Fricativas sonoras: 3
Oclusivas sonoras: 2
Laterais vibrantes: 2

Lateral: 0

Vogais: 38

Ditongos orais: 6

Vogais orais:33
Vogais nasais: 5

Consoantes intercaladas: 1

Estrofe IV

Não é noite nem dia,
Não é morte nem vida:
É viagem sem mapa,
Sem volta nem partida.

Consoantes: 24
Nasais: 7

Consoantes

Fricativas surdas: 2
Oclusivas surdas: 6

Nasal palatal: 0
Linguodental nasal: 6
Oclusivas nasais: 2
Fricativas sonoras: 4
Oclusivas sonoras: 3
Laterais vibrantes: 2

Lateral: 0

Vogais: 32

Ditongos orais: 2
Ditongos nasais: 2
Hiatos: 2

Vogais orais:22
Vogais nasais: 10

Consoantes intercaladas: 0

Estrofe V

O céu da liberdade,
Por onde o coração
Já nem sofre, sabendo
Que bateu sempre em vão.

Consoantes: 28
Nasais: 1

Consoantes

Fricativas surdas: 5
Oclusivas surdas: 5

Nasal palatal: 0
Linguodental nasal: 1
Oclusivas nasais: 0
Fricativas sonoras: 2
Oclusivas sonoras: 5
Laterais vibrantes: 5

Lateral: 1

Vogais: 32

Ditongos orais: 2
Ditongos nasais: 2

Vogais orais: 22
Vogais nasais: 10

Consoantes intercaladas: 2

Eventos que envolvem maiores obstáculos à passagem do ar no momento da emissão: as consoantes oclusivas bilabiais; as fricativas labiodentais; a ocorrência de uma consoante intercalada.

A esse aspecto podem estar associados conteúdos semânticos indicadores de conflitos; podem também servir para evidenciar determinado conteúdo semântico, isolado ou paralelamente a outra ocorrência.

A repetição de palavras de um verso no verso subseqüente, gera uma reiteração dos sons, um prolongamento do efeito associado, quer a uma reiteração do conteúdo semântico, quer à introdução de uma idéia contrária.

À presença de fonemas que envolvam menores obstáculos pode ser associada a idéia de fluidez. Quanto mais acomodada é a posição dos órgãos do aparelho fonador para a emissão de um som, melhor flui a leitura (embora algumas opções gerem monotonia).

A emissão de vogais nasaladas representa uma posição muito cômoda para os órgãos do aparelho fonador.

Considerando a primeira estrofe, é possível constatar a ocorrência de aliteração em S e M; assonância em O e a flagrante nasalização nas vogais nos dois primeiros versos.

A semelhança se estende do parentesco sonoro à construção: o verso um é ligado ao verso dois pela pontuação, os dois pontos estabelecem o início de uma comparação que apresenta o comparante no segundo verso, completando esta primeira idéia.

Considerando a relação semântica entre os dois primeiros versos, a comparação que relaciona os dois versos estabelece a seguinte imagem: o sonho esta para o poeta o que o mar representa para o peixe.

Este dado ratifica as opções construídas no nível semântico e estabelece uma identidade para o poema.

O verso um traz ainda o pronome possessivo “meu” e a primeira pessoa verbal “moro”, que confere um tom pessoal a canção.

O verso três reitera a identidade de construção, pois suas duas metades têm a mesma sintaxe:

               “o que sou e o que vejo”

O verbo “é”, de ligação, coloca no mesmo plano sujeito e predicativo; logo ser e ver tem uma identidade comum, na seqüência o verso quatro confirma esta identidade:

                “vejo e sou meu olhar”

A rima do segundo com o quarto verso, através da aproximação sonora sugere significados e associações:

Mar – água, reflexo do céu, transparência e profundidade;

Olhar – contemplação, reflexo do mundo exterior;

Olhos – Transparência do mundo interior.

Sonho – Sugere mergulho no inconsciente, devaneio, desejo e reflexão.

Devemos anotar as relações sensoriais, como elemento sinestésico:

Mar – Frio e molhado;

Matizes – O verde e azul característicos do mar;

Som – Marulho

Gustação – O sal marinho.

Esta estrofe associa sonho e contemplação, alinha elementos do mundo exterior com as reflexões em curso no íntimo do poeta.

Seguindo para a segunda estrofe identificaremos a ocorrência de tensão rítmica, dupla possibilidades de acentuação do verso vejam:

á – gua é o – MEU – pró – prio – COR – (pó)  E.R. 6(3-6)
1     2              3      4       5        6

Á – gua é o – meu – PRÓ – prio – COR – (pó) E.R. 6(1-4-6)
1     2              3     4         5       6

Esta ocorrência exige uma atenção especial a este verso, a fusão de água com o corpo do poeta. Revela-se que o ambiente do poeta, o “mar” do poeta, é o sonho.

A referencia de “água” no quarteto anterior estabelece uma relação entre ‘mar’ e ‘olhar’. Reaparecem todas as associações da estrofe anterior, e corpo também é água dispensando a analogia entre sonho e peixe.

Os versos seis, sete e oito, apresentam o mesmo esquema rítmico da primeira estrofe:

“sim – ples – MEN – te – mais – DEN (so)”  E.R. 6(3-6)
  1        2         3           4     5         6

“e – meu – COR – pó é – mi – NHA AL(ma)”  E.R. 6(3-6)
  1    2          3       4      5      6

“e o – que – SIN – to é o – que  – PEN(so)” E.R. 6(3-6)
   1       2        3     4          5        6

Surgem nestes versos algumas antíteses, que valem a anotação: corpo/alma e sinto/penso.

A palavra “corpo” faz rima toante com “sonho”, do verso um, “alma” faz rima toante com “água”, do verso dois; “penso” tem a mesma vogal anasalada de “denso”, criando uma identidade fônica por associação.

                 Corpo = Sonho

                Alma = Água = Mar;

Observando a relação sintática dos versos, vê-se a mesma construção:
 
               “Água é o meu próprio corpo” (v.5)

               “E meu corpo é minha alma” (v.7)

                 Uma nova relação sintática:

                 Água = corpo
                 Corpo = alma;

                 Ainda:

                “o que sou é o que vejo” (v.3)

                “e o que sinto é o que penso” (v.8)

                 Um paralelismo sintático,

                 O que (sou/sinto) é  o que (vejo/penso)

                 Apresenta-se a oposição
                 Corpo X Alma
                 Sinto X Penso.

                 Que se desenvolverá a seguir.

 Assim vou no meu sonho
                 Se outra fui, se perdeu.
                 É o mundo que me envolve?
                 Ou sou contorno seu?

A terceira estrofe repete o esquema rítmico predominante no poema, sem exceção e ainda conserva a estrutura sintática e semântica das outras duas estrofes.

O verso inicial da estrofe (v.9) faz eco ao verso um conserva sua estrutura alterando apenas o verbo: troca “moro” por “vou”, com rima toante entre os dois termos.  O efeito desta troca é a circunstancia de passividade contida em “morar”, ganhando dinâmica com a idéia de transporte “vou”.

Cabe questionar: vou no X vou ao; apresenta-se neste caso uma licença?

Se – outra – FUI;
Se – per – DEU.

Dividido o verso verificamos identidade sonora em “se”, porém cada um deles com sentido próprio: conjunção condicional e pronome pessoal; diferença semântica e diferença sintática. Esta circunstancia registra o surgimento de tensão no duplo sentido.

Os versos onze e doze apontam a fusão do poeta com o mundo, à ambigüidade se apresenta na indeterminação pela interrogação. Este questionamento reporta a um mergulho e a busca de uma situação diante do mundo a que pertence o poeta e o poeta que faz parte deste mesmo mundo.

A oposição  nos dois últimos versos da estrofe gera uma nova tensão reforçando a incerteza do poeta.

Os versos ímpares registram rimas toantes em O, como nas estrofes anteriores. O corpo envolve as pessoas, almas; como o mundo ao poeta, o poeta integra o sonho, como contorno do mundo.

Pela rima toante, reaparece a ligação entre mundo interior e exterior, numa relação direta – corpo, envolve- retomando a metáfora da água, reflexo e a correspondência entre os contrários.

Vejamos a quarta estrofe e seu esquema rítmico:

                13. Não é noite nem dia, E.R. 6(3-6)
                14. não é morte nem vida: E.R. 6(3-6)
                15. é viagem noutro mapa, E.R. 6(2-4-6)
                16. sem volta nem partida. E.R. 6(2-4-6)

Os dois primeiros versos conservam o esquema rítmico predominante, enquanto os outros dois alteram a leitura rítmica em paralelo com a derivação da atmosfera.

Os versos treze e quatorze apresentam sua construção estabelecida em dupla negativa:

                Não é (noite/morte) nem (dia/vida)

Ficam claramente definidas as associações e comparações entre os termos. Há a oposição direta noite X dia e vida X morte, relaciona-se também a identidade fônica: noite = morte e dia = vida. Estes dois versos estabelecem uma tensão que rompe com a noção de existência e tempo; fora do dia ou da noite, fora da morte ou da vida, fora do tempo.

Os dois versos seguintes propõem esta ruptura relacionada ao espaço.

                  “é viagem noutro mapa,
                    sem volta nem partida.”

Estabelecida a relação de anespacialidade, paralelamente o autor constrói um novo metro, rompendo o esquema rítmico dentro da progressão do poema.

                Vejamos o que nos reserva a última estrofe:

                      17. O céu da liberdade, E.R. 6(2-4-6)
                      18. por onde o coração E.R. 6(2-4-6)
                      19. já nem sofre, sabendo E.R. 6(3-6)
                      20. que bateu sempre em vão E.R. 6(3-6)

São dois esquemas rítmicos que se justificam na abordagem semântica, coerente com as opções do poeta até aqui.

 

A anespacialidade e a atemporalidade contida na penúltima estrofe desembocam nos dois primeiros versos da estrofe seguinte, com um emblemático “céu da liberdade” proclama uma evasão, um recolhimento que, paradoxalmente, representa a libertação. Em liberdade, o coração não sofre mais nem bate em vão.

A estrofe funciona como um elemento coeso, apesar da diferenciação no ritmo, por conta da tensão poética obtida na estrofe anterior, os dois últimos versos relacionam o poeta com o mundo e a sua materialidade, sua relação com o exterior, seus sofrimentos.

Toda a estrofe final é um único período: trata-se da causa da evasão: o choque com o mundo real. Ante tal motivo, enriquece-se a contemplação. Por outro lado, a alusão ao mundo real resulta em comunhão com ele, já anunciada desde a metáfora do mar e da água.

O reflexo e a correspondência adquirem profundidade, unindo num todo o poeta e o mundo.

Pesquisa sobre o vocabulário empregado.

 

assim                                                                         

adv.

1. Deste (daquele ou desse) modo.

2. Do mesmo modo.

conj.

3. Logo; porém.

Ainda assim: contudo.

Assim seja: amém; oxalá.

Como assim: que me diz? Por quê?

 

como

conj.

1. Do mesmo modo que.

2. Quando.

3. Logo que.

4. Visto que.

5. Se.

6. Uma vez que.

7. Segundo, conforme.

8. De que modo?

adv.

9. Quanto; por quanto.

s. m.

10. O modo por que.

 

comer (ê) –

v. tr.

1. Mastigar e engolir.

2. Dissipar.

3. Lograr.

4. Defraudar.

5. Gastar.

6. Enganar.

v. intr.

7. Tomar alimento.

8. Ter comichão.

9. Causar comichão.

10. Tirar proveito.

11. Roubar.

v. pron.

12. Amofinar-se, consumir-se.

s. m.

13. Comida.

14. Alimento

 

em

prep.

Indicativa de relação de lugar (em casa), tempo (em Janeiro! janeiro), modo (em cabelo), preço (avaliado em dez centavos). (Com o gerúndio, equivale a logo que, depois que [ex.: em chegando, lá irá].)

 

sonho | s. m.
1ª pess. sing. pres. ind. de sonhar

 

sonho (ô)

s. m.

1. Conjunto de idéias e de imagens que se apresentam ao espírito durante o sono.

2. Fig. Utopia; imaginação sem fundamento; fantasia; devaneio; ilusão; felicidade; que dura pouco; esperanças vãs; idéias quiméricas.

3. Bolo muito fofo, de farinha e ovos, frito em azeite ou manteiga e passado por calda de açúcar.

 

sonhar 

v. intr.

1. Ter um sonho ou sonhos.

2. Fantasiar; devanear.

3. Ter idéia fixa.

4. Cuidar em.

5. Pensar com insistência em.

v. tr.

6. Ver em sonhos.

s. m.

7. Sonho.

 

peixe | s. m.
 

 

peixe

s. m.

1. Zool. Animal vertebrado que nasce e vive na água e que respira por guelras.

2. Fig. Mulher vistosa.

 

 

mar | s. m.
 

 

mar

s. m.

1. Massa líquida que circunda os continentes (oceano), ou os penetra (mar interior).

2. Por ext. Grande lago.

3. Fig. Abismo.

4. Imensidade.

5. Grande quantidade.

6. Lugar onde se luta.

7. Lutas, dificuldades.

8. Inquietações.

Mar de gelo: geleira.

 

que | pron. rel. | pron. interr. | conj. integr. | conj. compar. | conj. advers. | conj. cop. | adv. | pron. indef.
 

 

que

pron. rel.

1. (servindo de sujeito: O homem que me vê; de complemento direto! direto: O homem que vejo; de complemento indireto! indireto: O homem de que falo).

2. O qual, do qual.

pron. interr.

3. Que coisa: Que me quer?

conj. integr.

4. O seguinte: Digo que tem razão.

conj. compar.

5. O pai é melhor que ou do que o filho.

conj. advers.

6. Mas, porém: De mim cuidarei, que não de vós.

conj. cop.

7. E: Dá-lhe que dá-lhe.

adv.

8. Quanto, quão: Que bela noite!

pron. indef.

9. Quanto: Que de gente!
Confrontar: quê.

 

 

Sou

1ª pess. sing. pres. ind. de ser

 

ser (ê) –  
 (latim sedeo, -ere, estar sentado)

v. intr.

1. Serve para ligar o sujeito ao predicado.

2. Serve de auxiliar nos tempos compostos dos verbos passivos.

3. Exprime a existência sem esse caráter!caráter absoluto.

4. Acontecer.

5. Indica o momento, o dia, a estação, o ano, a época.

6. Exprime a realidade.

7. Acontecer, ocorrer, suceder.

8. Estar, ficar, tornar-se.

9. Consistir em.

v. auxil.

10. Usa-se seguido do particípio passado, para formar a voz passiva (ex.: foram ultrapassados, tinha sido comido, fora pensado, será espalhado, seríamos enganados).

s. m.

11. Aquilo que é, que existe, ente.

12. O ente humano.

13. Existência, vida.

14. O organismo, a pessoa física e moral.

15. Forma, figura.

Ciência do ser: ontologia.

Não poder deixar de ser: ser necessário; ter forçosamente de ser.

Não poder ser: não ser possível.

Não ser para graças: não gostar de brincadeiras; ser valente.

O Ser dos Seres: Deus.

Ser alguém: ser pessoa importante e de valia.

Ser com: proteger.

Ser dado a: ter inclinação para.

Ser da gema: ser genuíno.

Ser da mesma panelinha: estar de acordo com outras pessoas; combinar bem com elas.

Ser da pele do diabo: não lhe doerem às pancadas; ser inquieto, traquinas.

Ser de crer: ser crível; merecer fé.

Ser homem: ter grandes qualidades ou aptidões.

Ser pensante: o homem.

 

 

É

 

3ª pess. sing. pres. ind. de ser

 

ser (ê) –  
(latim sedeo, -ere, estar sentado)

v. intr.

1. Serve para ligar o sujeito ao predicado.

2. Serve de auxiliar nos tempos compostos dos verbos passivos.

3. Exprime a existência sem esse caráter!caráter absoluto.

4. Acontecer.

5. Indica o momento, o dia, a estação, o ano, a época.

6. Exprime a realidade.

7. Acontecer, ocorrer, suceder.

8. Estar, ficar, tornar-se.

9. Consistir em.

v. auxil.

10. Usa-se seguido do particípio passado, para formar a voz passiva (ex.: foram ultrapassados, tinha sido comido, fora pensado, será espalhado, seríamos enganados).

s. m.

11. Aquilo que é, que existe, ente.

12. O ente humano.

13. Existência, vida.

14. O organismo, a pessoa física e moral.

15. Forma, figura.

Ciência do ser: ontologia.

Não poder deixar de ser: ser necessário; ter forçosamente de ser.

Não poder ser: não ser possível.

Não ser para graças: não gostar de brincadeiras; ser valente.

O Ser dos Seres: Deus.

Ser alguém: ser pessoa importante e de valia.

Ser com: proteger.

Ser dado a: ter inclinação para.

Ser da gema: ser genuíno.

Ser da mesma panelinha: estar de acordo com outras pessoas; combinar bem com elas.

Ser da pele do diabo: não lhe doerem às pancadas; ser inquieto, traquinas.

Ser de crer: ser crível; merecer fé.

Ser homem: ter grandes qualidades ou aptidões.

Ser pensante: o homem.

 

 

Vejo

 

 

1ª pess. sing. pres. ind. de ver

 

ver (ê)  

v. tr.

1. Exercer o sentido da vista sobre.

2. Olhar para.

3. Presenciar, assistir a.

4. Avistar; enxergar.

5. Encontrar, achar, reconhecer.

6. Observar, notar, advertir.

7. Reparar, tomar cuidado em.

8. Imaginar, fantasiar.

9. Calcular, supor; ponderar, inferir, deduzir.

10. Prever.

11. Visitar.

12. Escolher.

13. Percorrer.

14. Provar.

15. Conhecer.

v. pron.

16. Olhar-se.

17. Encontrar-se.

s. m.

18. Parecer; juízo; opinião.

19. O ato!ato de ver.

A meu ver: em minha opinião.

Ficar a ver navios: ficar logrado.

Ver-se e desejar-se: estar muito aflito, muito embaraçado.

 

 
água | s. f. | s. f. pl.
 
     

 

água

s. f.

1. Líquido natural, transparente, incolor, geralmente insípido e inodoro, que brota da terra, e ocupa os 4/5 do Globo.

2. Lugar por onde a água corre ou se aglomera.

3. Chuva.

4. Suor.

5. Lágrimas.

6. Seiva.

7. Limpidez (das pedras preciosas).

8. Lustre, brilho.

9. Nome de vários preparados farmacêuticos.

10. Veio por onde entra água no navio.
águas

s. f. pl.

11. Sítio onde se tomam águas minerais.

12. Urina.

13. Vertentes do telhado.

14. Ondulações, reflexos.

15. Hemorragia que precede o parto.

16. Limites marítimos de uma nação

 

 

próprio | adj. | s. m.
 

 

próprio

adj.

adj.

1. Que pertence exclusivamente a alguém.

2. Em pessoa, à pessoa de.

3. Textual.

4. Exatamente!Exatamente semelhante.

5. Mais adequado; apropriado, conveniente.

6. Certo, pontual.

7. Gram. Primitivo e natural, não figurado nem translato.

s. m.

8. Qualidade peculiar, caráter!caráter próprio, sinal característico.

9. Mensageiro expresso.

10.  Relig. Diz-se de certos ofícios religiosos.

A mim próprio: à minha pessoa; a ti próprio, à tua pessoa; a si próprio, à sua pessoa, etc.

À própria: propriamente; à justa.

Mais à própria: para melhor dizer.

Os próprios nacionais: tudo o que é propriedade do Estado.

 

corpo | s. m.
 

 

corpo (ô)

s. m.

1. Tudo o que ocupa espaço e constitui unidade orgânica ou inorgânica.

2. O que constitui o ser animal (vivo ou morto).

3. Cadáver.

4. Tronco humano.

5. Parte do vestuário que cobre o tronco.

6. Parte principal ou central de certos objetos!objetos.

7. Corporação.

8. Classe de indivíduos da mesma profissão.

9. Grupo, multidão.

10. Regimento.

11. Grande divisão dum exército que opera conjuntamente.

12. Coleção!Coleção.

13. Consistência, grossura.

14. Densidade.

15. Calibre da altura dos caracteres!carateres tipográficos.

16. Fig. Contexto; base; importância.

17. Anat. Parte principal de um osso ou músculo.

Corpo da obra: texto de uma obra sem os elementos acessórios (guardas, costura, etc.).

Corpo de delito: verificação da existência dum crime e suas circunstâncias.

Documento que o descreve.

Corpo do livro: conjunto formado pelos cadernos, uma vez cosidos; miolo.

Dar de corpo: defecar.

Em corpo: sem xale ou sem capa.

Em corpo bem feito: sem agasalho.

Meio corpo: da cintura para cima.

Tomar corpo: tomar consistência, principiar a ter visos de verdade.

 

 

Simplesmente

 

derivação de simples

 

simples

adj. 2 gén. 2 núm.

adj. 2 gén. 2 núm.

1. Que não é composto.

2. Que não é complicado.

3. Sem ornatos nem enfeites.

4. De fácil interpretação.

5. Puro; claro.

6. Singelo; inocente.

7. Mero; natural.

8. Ingênuo; crédulo.

9. Vulgar.

10. Exclusivo.

11. Fácil.

12. Modesto.

13. Sem luxo.

14. Individuado.

15. Gram. Diz-se dos tempos dos verbos que se conjugam sem auxiliar.

s. 2 gén. 2 núm.

16. Pessoa simples, humilde, ignorante.

s. m. pl.

17. Pop. Cimbres.

Superl.: simplicíssimo.

 

 

 

mais | adv. | det. e pron. indef. | s. m. | s. m. pl.
 

 

mais

adv.

1. Em maior quantidade.

2. Em maior grau.

3. Outra vez.

4. Antes, melhor, preferentemente.

5. Além.

6. Ainda.

det. e pron. indef.

7. Maior quantidade.

s. m.

8. O resto, o restante.

9. Maior quantidade ou maior quantia.

10. Outra coisa.

s. m. pl.

11. Os outros.

Mais que tudo: principalmente, mormente, em primeiro lugar. (V. mais-que-tudo)

 

 

 

denso | adj.
1ª pess. sing. pres. ind. de densar

 

denso

adj.

adj.

1. Que pesa muito em relação a outros corpos de igual volume.

2. Expresso.

3. Negro.

4. Carregado.

5. Cerrado.

 

densar

v. tr.

Condensar.

 

 

minha | pron. poss. f. | s. f.
fem. sing. de meu

 

minha

pron. poss. f.

1. Flexão feminina de meu.

s. f.

2. Variedade de pêra!pera.

 

meu

det. e pron. dem.

1. De mim, pertencente à minha pessoa.
meus

s. m. pl.

2. A minha família.

 

 

alma | s. f. | s. f. pl.
 

 

alma

s. f.

1.  Relig. Parte imortal do ser humano.

2. Pessoa, indivíduo.

3. Habitante.

4. Índole.

5. Vida.

6. Consciência.

7. Espírito.

8. Fig. Agente, motor principal; o que dá força e vivacidade.

9. Essência, fundamento.

10. Entusiasmo, calor.

11. Ânimo, coragem, valor.

12. Ente querido.

13. Técn. Interior da arma de fogo.

14. Peça de madeira no interior da rabeca, por baixo do cavalete.

15. Parte bicôncava do carril entre a cabeça e a patilha.

16. Pedacinho de cabedal entre a sola e a palmilha.

17. Pedaço de sola que fortalece o enfranque do calçado.

18. Válvula do fole.

19. O vão entre o calcanhar e o joanete.

20. O vão da maçaroca, do novelo, etc.

21. Chancela ou sinete de carta.

22. Mote de divisa.

23. Peça interior do botão coberto.
almas

s. f. pl.

24. Alminhas; almas do Purgatório.

Alma de cântaro: paspalhão, estúpido.

Alma penada: a que vagueia penando pelo mundo.

Toque das almas: o último toque diário dos sinos nas pequenas localidades.

 

 

Sinto

 

 

1ª pess. sing. pres. ind. de sentir

 

sentir  

v. tr.

1. Perceber por um dos sentidos.

2. Ouvir indistintamente.

3. Perceber o que se passa em nós.

4. Estar convencido ou persuadido de.

5. Ter a consciência de.

6. Conhecer, notar, reconhecer.

7. Conjeturar!Conjeturar, supor com certos fundamentos, prever.

8. Aperceber-se de, dar fé ou notícia de.

9. Compreender, certificar-se de.

10. Adivinhar, pressagiar; pressentir.

11. Lamentar, afligir-se por.

12. Ressentir-se, melindrar-se ou ofender-se com.

13. Julgar, reputar, considerar.

14. Sofrer as conseqüências de.

15. Ressentir-se; experimentar mudança ou alteração física ou moral por causa de.

16. Conhecer por certos indícios.

17. Bel.-art. Ter o sentimento estético.

18. Ser impressionado por.

19. Saber traduzir por meio da arte.

v. intr.

20. Ter a faculdade de sentir.

21. Ter sensibilidade; ter alma sensível.

v. pron.

22. Ter a consciência de algum fenômeno ou do que se passa no interior de si mesmo.

23. Apreciar o seu estado físico ou moral.

24. Reputar-se, conhecer-se.

25. Ofender-se.

s. m.

26. Sensibilidade.

27. Sentimento.

28. Opinião, parecer.

 

 

 

penso | s. m. | adj.
1ª pess. sing. pres. ind. de pensar

 

penso
(derivado regressivo de pensar)

s. m.

1. Tratamento de comida, limpeza, etc., que se faz a crianças.

2. Tratamento de gado.

3. Tratamento de feridas. = curativo

4. Ant. Pensamento.

adj.

adj.

5. Bras. Pendido; inclinado.

Penso higiênico: faixa de material absorvente destinada a reter o fluxo menstrual ou o corrimento vaginal.

Penso rápido: pequena faixa de gaze, coberta de medicamento e de material protetor!protetor, destinada a cobrir;proteger ou manter limpa uma ferida ou sutura.

Pôr um penso: fazer um curativo.

 

pensar

v. intr.

1. Formar idéias.

2. Refletir!Refletir.

3. Raciocinar.

4. Ser de parecer.

5. Tencionar.

6. Ter no pensamento.

v. tr.

7. Imaginar, julgar.

8. Planear.

9. Dar penso a.

10. Tratar convenientemente.

11. Fazer curativo.

s. m.

12. Pensamento; opinião; juízo.

 

 

Vou

 

1ª pess. sing. pres. ind. de ir

 

ir

v. intr.

1. Passar ou ser levado de um lugar para outro.

2. Caminhar, andar.

3. Voar.

4. Dirigir-se.

5. Decorrer.

6. Freqüentar.

7. Orçar.

8. Distar.

9. Seguir; levar.

v. pron.

10. Derramar-se.

11. Partir.

12. Morrer.

13. Acabar.

14. Correr, passar.

15. Evaporar-se; desvanecer-se.

 

 

no | contr. | pron.
 

 

no

contr.

contr.

1. Contração!Contração de em o.

pron.

2. o (depois de sílaba nasal de verbos: ex.: tem-no).

 

 

SE | símb.

se | conj. | pron. pess. 2 gén. | pron. indef.

 

 

SE

símb.

Símbolo de sueste.
Confrontar: sé.

se

conj.

1. No caso de, dando-se a circunstância de.

2. Se acaso, se porventura.

pron. pess. 2 gén.

3. Sua pessoa.

pron. indef.

4. A gente, nós.

5. Alguém indefinido.

 

 

Outra

fem. sing. de outro

 

outro

det. e pron. indef.

1. Não este.

2. Diferente.

3. Mais um.

4. Seguinte.

5. Precedente.

6. Restante.
outros

pron. indef. m. pl.

7. Os alheios.

 

 

Fui

 

 
 

 

1ª pess. sing. pret. perf. ind. de ir

1ª pess. sing. pret. perf. ind. de ser

       

 

ir

v. intr.

1. Passar ou ser levado de um lugar para outro.

2. Caminhar, andar.

3. Voar.

4. Dirigir-se.

5. Decorrer.

6. Freqüentar.

7. Orçar.

8. Distar.

9. Seguir; levar.

v. pron.

10. Derramar-se.

11. Partir.

12. Morrer.

13. Acabar.

14. Correr, passar.

15. Evaporar-se; desvanecer-se.

 

ser (ê)
(latim sedeo, -ere, estar sentado)

v. intr.

1. Serve para ligar o sujeito ao predicado.

2. Serve de auxiliar nos tempos compostos dos verbos passivos.

3. Exprime a existência sem esse caráter!caráter absoluto.

4. Acontecer.

5. Indica o momento, o dia, a estação, o ano, a época.

6. Exprime a realidade.

7. Acontecer, ocorrer, suceder.

8. Estar, ficar, tornar-se.

9. Consistir em.

v. auxil.

10. Usa-se seguido do particípio passado, para formar a voz passiva (ex.: foram ultrapassados, tinha sido comido, fora pensado, será espalhado, seríamos enganados).

s. m.

11. Aquilo que é, que existe, ente.

12. O ente humano.

13. Existência, vida.

14. O organismo, a pessoa física e moral.

15. Forma, figura.

Ciência do ser: ontologia.

Não poder deixar de ser: ser necessário; ter forçosamente de ser.

Não poder ser: não ser possível.

Não ser para graças: não gostar de brincadeiras; ser valente.

O Ser dos Seres: Deus.

Ser alguém: ser pessoa importante e de valia.

Ser com: proteger.

Ser dado a: ter inclinação para.

Ser da gema: ser genuíno.

Ser da mesma panelinha: estar de acordo com outras pessoas; combinar bem com elas.

Ser da pele do diabo: não lhe doerem às pancadas; ser inquieto, traquinas.

Ser de crer: ser crível; merecer fé.

Ser homem: ter grandes qualidades ou aptidões.

Ser pensante: o homem.

 

Perdeu

 

 

3ª pess. sing. pret. perf. ind. de perder

 

perder (ê)  

v. tr.

1. Deixar de ter alguma coisa útil, proveitosa ou necessária, que se possuía, por culpa ou descuido do possuidor, ou por contingência ou desgraça.

2. Sofrer prejuízo, dano, ruína, detrimento ou diminuição em.

3. Não conseguir o que se deseja ou ama.

4. Desperdiçar, dissipar, malbaratar, menosprezar.

5. Deixar de gozar, de atender, deixar passar despercebido.

6. Descair do conceito, crédito ou estima.

7. Esquecer.

8. Causar dano ou ruína a, ou o mal ou a desgraça de.

9. Junto com alguns nomes, faltar à obrigação do que significam, ou fazer alguma coisa em contrário, como: perder o respeito, a vergonha, a educação, a cortesia, etc.

10. Tratando-se de guerra, morrer, ficar prisioneiro ou ser derrotado.

v. intr.

11. Sofrer dano, prejuízo, quebra, etc.

12. Diminuir de valor, merecimento, conceito, etc.

13. Ser vencido (em jogo, aposta, etc.).

v. pron.

14. Errar o caminho, transviar-se.

15. Não achar saída.

16. Não achar meio de remover uma dificuldade.

17. Deixar de ser ouvido ou percebido.

18. Desaparecer, sumir-se, extinguir-se, esvaecer-se.

19. Estragar-se.

20. Inutilizar-se.

21. Conturbar-se, arrebatar-se.

22. Desvairar-se, desorientar-se.

23. Confundir-se, baralhar-se.

24. Sofrer dano ou prejuízo.

25. Arruinar-se.

26. Ficar pobre ou desgraçado.

27. Entregar-se aos vícios.

28. Perverter-se.

29. Pecar.

30. Ficar desonrado.

31. Deixar-se irresistivelmente dominar por uma paixão, por um afeto!afeto veemente.

32. Ficar preocupado, absorvido.

33. Naufragar.

34. Pôr-se em risco de perder a vida.

35. Não se aproveitar de alguma coisa.

36. Cair em desuso.

 

 

mundo | s. m. | adj.
 

 

mundo

s. m.

1. O espaço com todos os seus corpos e seres.

2. Universo.

3. Conjunto dos astros a que o Sol serve de centro.

4. Globo terrestre.

5. Esfera armilar.

6. Astro; planeta.

7. Cada um dos dois grandes continentes terrestres, particularmente a América, quando chamada Novo Mundo.

8. Por ext. A gente; a humanidade.

9. A vida terrestre.

10. Classe, categoria social.

11. Sociedade.

12. Tudo o que é grande.

13. Prazeres materiais.

adj.

adj.

14. Mundificação, limpo; puros.

Mundos e fundos: grandes riquezas; grandes promessas.

O outro mundo: a vida futura.

Vir ao mundo: nascer.

Terceiro mundo: conjunto de países pobres ou subdesenvolvidos

 

 

me | pron. pess. 2 gén.
 

 

me

pron. pess. 2 gén.

A mim; para mim.

 

 

Envolve

 

3ª pess. sing. pres. ind. de envolver

2ª pess. sing. imp. de envolver

 

envolver (ê)

v. tr.

1. Meter dentro de envoltório; enrolar; enfaixar.

2. Incluir; meter (entre outros, ou como partícipe em alguma coisa).

3. Comprometer.

4. Implicar.

5. Cercar, rodear; apertar em cerco.

6. Confundir.

7. Abranger.

8. Misturar.

v. pron.

9. Tomar parte; entremeter-se.

10. Cobrir-se.

11. Misturar-se.

12. Confundir-se.

13. Embaraçar-se.

 

 
ou | conj.
 
     

 

ou
(latim aut)

conj.

1. Indica alternativa ou opcionalidade (ex.: ver um filme ou ler um livro).

2. Indica conseqüência derivada da irrealização de algo (ex.: despacha-te ou não vamos chegar a tempo).

3. Indica a confirmação de um enunciado anterior (ex.: estava com pressa ou não teria saído sem me despedir).

4. Indica explicação ou paráfrase do que foi enunciado anteriormente (ex.: o ator!ator, ou profissional do espetáculo!espetáculo).

 

 
contorno | s. m.
1ª pess. sing. pres. ind. de contornar
     

 

contorno (ô)
(derivação regressiva de contornar)

s. m.

1. Redor, circuito.

2. Periferia.

3. Linha que determina os relevos (naturais ou artísticos).

4. O bem torneado dos membros, do busto, etc.

5. Perfil.

6. Fig. Relevo, vigor, elegância (do estilo ou do discurso).

 

contornar  
(con- + tornar)

v. tr.

1. Marcar o contorno de.

2. Dar volta a.

3. Passar pela parte exterior de.

4. Arredondar (frases, períodos).

5. Fig. Querer penetrar as intenções de alguém.

6. Heráld. Contrabandar.

7. Heráld. Voltar para a parte esquerda do escudo.

 

 

seu | pron. poss. | s. m. | s. m. pl.
 

 

seu

pron. poss.

1. possessivo da 3.ª pessoa, também empregado em vez de vosso.

2. Dele; dela; deles; delas.

3. De vós: como está seu pai?

4. De si próprio: protege-o com dinheiro seu.

5. Adotado!Adotado, usado, seguido: as suas máximas.

6. Que lhe pertence: aí é o seu lugar.

7. Estimado, preferido.

8. Proveniente de si: isso não parece seu; essa não parece sua.

9. Expletivamente: o negócio tem as suas dificuldades.

s. m.

10. O que pertence a alguém: dar o seu a seu dono.

11. Posse, fortuna: não ter nada de seu.

12. Redução popular em próclise, de senhor.
seus

s. m. pl.

13. Os parentes, a família: como passam todos os seus?

14. Partidários; companheiros.

 

 
não | adv. | s. m.
 
     

 

não

adv.

1. Partícula negativa oposta à afirmativa sim.

2. De modo nenhum. (É algumas vezes partícula expletiva.)

s. m.

3. Recusa; negação

 

noite | s. f.
 

 

noite

s. f.

1. Tempo compreendido entre o crepúsculo vespertino e o matutino.

2. Noitada.

3. Fig. Escuridão; obscuridade.

4. Tristeza.

5. Morte.

6. Ignorância.

7. Época muito remota.

Das mil e uma noites: esplendoroso, deslumbrante.

Noite e dia: continuamente.

Noite eterna ou noite do túmulo: morte.

Noite velha: alta noite.

Perder a noite: passá-la sem dormir

 

nem | adv. | conj.
 

 

nem
(latim nec)

adv.

1. Partícula disjuntiva e negativa.

2. Não.

conj.

3. E não.

Nem mais nem menos: exatamente!exatamente.

Nem que: como se.

Que nem: mais do que.

 

 

dia | s. m.
 

 

dia
(latim dies, -ei)

s. m.

1. Espaço de tempo que vai desde a meia-noite até a meia-noite seguinte (dia civil).

2. Espaço de 24 horas compreendido do meio-dia até ao meio-dia seguinte (dia astronômico), ou do pôr do Sol ao pôr do Sol seguinte (dia israelita).

3. Unidade de tempo com a duração de 24 horas.

4. Espaço de tempo entre o levantar de uma pessoa e a entrada da noite.

5. Espaço de tempo em que o Sol está no horizonte.

6. Claridade do dia.

7. Circunstância ou momento oportuno. = ocasião, vez

8. Tempo atual!atual. = actualidade!atualidade, momento, presente

Andar em dia: saber o que se passa; estar atualizado!atualizado.

De dia: com luz solar, por oposição ao período noturno!noturno.

Dia cheio: dia que se passou regaladamente.

Dia útil: qualquer dia entre segunda-feira e sexta-feira, desde que não seja feriado, que constitui geralmente dia de trabalho para a maioria da população.

Estar em dia: não ter a escrituração atrasada.

Pôr-se em dia: trabalhar para estar em dia ou para estar atualizado!atualizado.

 

 

morte | s. f.
 

 

morte

s. f.

1. Ato!Ato de morrer.

2. O fim da vida.

3. Cessação da vida (animal ou vegetal).

4. Destruição.

5. Causa de ruína.

6. Termo, fim.

7. Homicídio, assassínio.

8. Pena capital.

9. Esqueleto nu ou envolto em mortalha, armado de foice, que simboliza a Morte.

De má morte: que não presta para nada.

De morte: com ódio figadal; mortalmente; que só acaba com a morte.

Morte civil: estado do que perde todos os seus direitos civis por pena infamante.

 

 
vida | s. f.
 
     

 

vida

s. f.

1. O espaço de tempo que decorre desde o nascimento até a morte dos seres.

2. Modo de viver.

3. Comportamento.

4. Alimentação e necessidade da vida.

5. Ocupação, profissão, carreira.

6. Princípio de existência, de força, de entusiasmo, de atividade!atividade (diz-se das pessoas e das coisas).

7. Fundamento, essência; causa, origem.

8. Biografia.

Vida civil: os direitos civis.

Vida eterna: vida futura, a outra vida, a existência espiritual depois da morte.

A bem-aventurança, a glória eterna.

 

 

viagem | s. f.
 

 

viagem

s. f.

1. O ato!ato de transportar-se de um ponto a outro distante.

2. Mar. Navegação, travessia.

3. Relação escrita dos acontecimentos ocorridos numa viagem e das impressões que ela nos causou.

 

 

noutro | contr.
 

 

noutro

contr.

contr.

Contração!Contração de em e outro.

 

 

mapa | s. m.
 

 

mapa

s. m.

1. Delineação convencional de qualquer extensão da superfície da Terra.

2. Lista, relação.

3. Quadro sinóptico.

 

 

volta | s. f. | s. f. pl.
3ª pess. sing. pres. ind. de voltar

2ª pess. sing. imp. de voltar

 

volta

s. f.

1. Ato!Ato de regressar a um lugar donde se partira.

2. Ato!Ato de virar ou de se virar.

3. Resposta, réplica.

4. Retorno; troco; demasia.

5. Movimento circular, giro.

6. Ato!Ato de percorrer a circunferência de.

7. Ação!Ação de volver.

8. Vicissitude.

9. Disposição diversa.

10. Curva, sinuosidade.

11. Cada uma das curvas de uma espiral.

12. Solução de uma dificuldade, interpretação.

13. Ato!Ato de se voltar ou turvar (o vinho, na vasilha).

14. Espécie de colar usado por mulheres.

15. Repercussão, reflexo.

16. Poét. Espécie de glosa em que o glosador escolhe e distribui à sua vontade as palavras do mote.

17. Tira branca de linho ou de algodão, na parte superior do cabeção dos padres, e das lentes e alunos da Universidade de Coimbra (hoje em desuso) e dos seminários.

18. Utensílio de tanoeiro para raspar o lado côncavo das aduelas.
voltas

s. f. pl.

19. Serviço de recados.

À volta de: por ou pela volta de, cerca, próximo de (falando-se do tempo).

Dar volta à chave: imprimir-lhe um movimento de rotação, para abrir ou fechar uma fechadura.

Dar volta o miolo a alguém: perder o juízo.

Dar voltas: empregar diligências para conseguir certo fim.

Dar voltas na cama: não dormir sossegado.

Dar voltas no inferno: empregar todos os meios para conseguir um fim que muito se deseja.

De volta com: de mistura.

Em volta de: em torno, em redor.

Estar de volta: ter regressado.

Estar de volta com alguém: andar em briga, em discussão, em despique com essa pessoa.

Fazer-se na volta de (alguma terra): virar de bordo para.

Furtar as voltas: mudar rapidamente de direção!direção, para não ser apanhado ou colhido.

Na volta: à volta, na ocasião ou depois do regresso.

Na volta do mar: ao sabor das ondas, das marés ocorrentes, sem vento e sem se poder seguir carreira.

Volta de honra (ou triunfal): volta olímpica.

Voltas do mundo: alternativas, da sorte.

 

voltar

v. tr.

1. Dar volta a, volver, virar; pôr do avesso.

2. Mostrar ou apresentar pelo lado ou face oposta.

3. Dar em troco.

v. intr.

4. Regressar.

5. Tornar a vir.

6. Reaparecer, tornar.

7. Replicar, responder; dar volta ou voltas; tornar a fazer.

8. Mudar de rumo.

9. Fermentar segunda vez; toldar-se, turvar-se.

10. Retroceder.

11. Reincidir.

v. pron.

12. Virar-se, apresentar a cara a quem vem ao lado ou atrás.

13. Dirigir-se, recorrer.

14. Revolver-se, virar-se; dar voltas (na cama); investir, acometer.

 

 

partida | s. f.
sing. part. pass. de partir

fem. sing. de partir

 

partida

s. f.

1. O ato!ato de partir de um lugar para outro; saída.

2. Morte.

3. Troço de gente armada.

4. Quantidade maior ou menor de mercadorias; sortimento.

5. No jogo, cada uma das mãos em que ele se divide; jogada.

6. Sarau.

7. Nota de débito ou de crédito num livro de escrituração comercial.

8. Brincadeira; pirraça.

9. Competição desportiva.

Correr as sete partidas do mundo: andar por muitas terras, viajar muito.

Escrituração por partidas dobradas: aquela em que para cada artigo se reconhece ao mesmo tempo um devedor e um credor.

Escrituração por partidas simples: aquela em que se indica apenas um credor ou um devedor.

Ponto de partida: princípio, origem.

 

partir  

v. tr.

1. Dividir em partes, separar.

2. Quebrar.

3. Repartir; distribuir.

v. intr.

4. Pôr-se a caminho, seguir viagem.

5. Ir-se embora, retirar-se.

6. Sair com ímpeto, arremessar-se.

7. Ter origem ou começo; proceder; provir.

8. Confinar.

9. Seguir, prosseguir; prolongar-se, estender-se.

v. pron.

10. Quebrar-se.

11. Dividir-se.

12. Retirar-se, sair.

13. Fugir, afastar-se.

14. Fig. Afligir-se, doer-se.

A partir de: a datar de.

Partir de um princípio: de uma doutrina, admitir um princípio ou doutrina como base dos seus argumentos.

 

partido

adj.

adj.

1. Dividido em partes.

2. Saído.

3. Heráld. Diz-se do escudo dividido perpendicularmente.

s. m.

4. União de muitas pessoas para um determinado fim; parcialidade, facção!fação, bando.

5. Rancho.

6. Expediente, recurso, resolução.

7. Trato ou convênio.

8. O território ou lugar onde o médico ou cirurgião tem obrigação de assistir.

9. Distrito ou território de alguma jurisdição ou administração.

Bom partido: proposta vantajosa.

Pop. Casamento rico.

Dar partido ao parceiro: conceder-lhe vantagens antes de começar o jogo.

Tomar o partido de: decidir-se a.

Declarar-se em favor de.

 

 

céu | s. m.
 

 

céu

s. m.

1. Ponto que a humanidade assinala para morada de Deus e dos justos.

2. A Providência. (Nestas duas acepções! aceções, grafa-se com inicial maiúscula.)

3. O infinito (no espaço).

4. Firmamento.

5. Atmosfera.

6. Clima; ar.

7. Parte superior, que serve como teto!teto, em certas coisas.

Cair do céu: chegar de improviso, mas a propósito.

Entre o céu e a terra: no ar.

Mover céu e terra: fazer todo o possível para conseguir algo.

 

 

liberdade | s. f. | s. f. pl.
 

 

liberdade

s. f.

1. Direito de proceder conforme nos pareça, contanto que esse direito não vá contra o direito de outrem.

2. Condição do homem ou da nação que goza de liberdade.

3. Conjunto das idéias liberais ou dos direitos garantidos ao cidadão.

4. Fig. Ousadia.

5. Franqueza.

6. Licença.

7. Desassombro.

8. Demasiada familiaridade.
liberdades

s. f. pl.

9. Imunidades, regalias.

 

 

por | prep.
 

 

por (u)

prep.

Designativa de várias relações; modo: por força; causa: por doença; meio: por terra ou por água; tempo: por um ano, etc.

 

 

onde | adv. | adv. interr.
 

 

onde

adv.

1. No qual lugar; no lugar em que.

adv. interr.

2. Em que lugar?

Onde quer que: em qualquer parte que.

 

 

coração | s. f.

coração | s. m.

derivação fem. sing. de corar

 

coração (ò)

s. f.

Cora.

 

coração

s. m.

1. Órgão musculoso, centro da circulação do sangue.

2. Parte exterior do corpo correspondente ao coração.

3. Fig. Sentimentos.

4. Sensibilidade, afeição, amor.

5. Consciência.

6. Coragem, valor.

7. Voz secreta.

8. Centro, parte mais central.

9. Cerne (da árvore).

10. Técn. Peça angular numa intersecção de via – férrea.

11. Bras. Varanda.

 

corar (cò)  

v. tr.

1. Dar cor a.

2. Branquear (expondo ao sol).

3. Fazer assomar a cor ao rosto.

4. Fig. Disfarçar, encobrir com falsa aparência.

5. Técn. Dar cor ao ouro.

v. intr.

6. Ruborizar-se, envergonhar-se.

 

| adv.
 

 


(latim jam)

adv.

1. Neste instante, agora.

2. De antemão.

3. Tão depressa.

Já, já: imediatamente, sem demora, no mesmo instante.

Já… já…: emprega-se como conjunção coordenativa disjuntiva, indicando alternativa (ex.:). = ora…, ora…; quer…, quer…

Já agora: já que chegamos a este ponto; como não há outro remédio.

Já que: visto que.

 

 

Sofre

 

3ª pess. sing. pres. ind. de sofrer

2ª pess. sing. imp. de sofrer

     

 

sofrer (ê)  

v. tr. e intr.

1. Suportar, padecer com resignação e paciência; tolerar.

2. Passar por.

3. Admitir.

4. Ter pesar.

v. pron.

5. Conter-se; reprimir-se; dissimular o sofrimento.

s. m.

6. Bras. Ave cujo canto imita a pronúncia do seu nome.

 

 

gerúndio de saber

 

saber (ê)  
(latim sapere, ter sabor, conhecer)

v. tr.

1. Possuir o conhecimento de.

2. Não ignorar.

3. Estar habilitado para.

v. intr.

4. Ter conhecimento.

5. Ter experiência.

6. Estar certo.

7. Ter sabor ou gosto.

v. pron.

8. Ser sabido.

s. m.

9. Conhecimentos adquiridos; ciência, ilustração.

10. Fig. Prudência; sensatez.

11. Malícia.

12. Experiência do mundo.

A saber: isto é; que é ou são; na ordem seguinte.

Sabê-la toda: tratar dos seus interesses com manha.

 

 

 

Bateu

 

3ª pess. sing. pret. perf. ind. de bater

 

bater (ê)  

v. tr.

1. Dar pancadas em.

2. Remexer.

3. Cravar.

4. Sacudir, fustigar.

5. Fig. Derrotar, vencer.

6. Atirar sobre.

v. intr.

7. Dar pancadas.

8. Chamar.

9. Vir de encontro.

10. Ir de batida.

11. Soar, palpitar.

v. pron.

12. Ter duelo ou desafio.

13. Combater de qualquer modo.

14. Gír. Comer.

s. m.

15. Ato!Ato de bater.

Bater a(s) bota(s) ou o cachimbo: morrer.

Bater à porta de alguém: socorrer ao seu valimento.

Bater a roupa: lavá-la na pedra.

Bater as asas: pairar, adejar.

Bater a sela: descansar.

Bater as palmas: chamar por alguém.

Bater em retirada: recuar, retirar-se, fugir ao combate, ceder.

Bater mato: percorrê-lo em procura de caça ou de alguém, de algum fugitivo.

Bater moeda: cunhá-la.

Bater no peito: arrepender-se.

Bras. Bater o campo: explorá-lo.

Bater o encaixe: percutir com o martelo o festo dos cadernos de um livro que se vai reencadernar!re-encadernar, para tirar a marca do primeiro encaixe.

Bater o justo: dizer a verdade.

Bater o mar: percorrê-lo em diversos rumos.

Bater o mato: andar por ele à procura de alguma coisa.

Bater o papel: alinhar pelas extremidades as pilhas de papel, batendo-as em montículos sobre a bancada, ou sujeitando-as à ação!ação de equipamentos mecânicos específicos.

Bater o pé: dar com força com o pé no chão.

Bater o pinho: tocar viola.

Bater os dentes ou o queixo: tiritar de frio ou de medo.

Bater o sujo: dizer a verdade.

Bater palmas: aplaudir

 

 

sempre | adv. | s. m.
 

 

sempre

adv.

1. Em todo o tempo.

2. A todos os momentos.

3. Todavia.

4. Realmente.

5. Afinal.

s. m.

6. Todo o tempo passado ou futuro.

 

 

vão | adj. | s. m.
3ª pess. plu. pres. ind. de ir

3ª pess. plu. imp. de ir

3ª pess. plu. pres. conj. de ir

 

vão

adj.

adj.

1. Vazio; oco.

2. Inútil, baldado.

3. Sem valor; ilusório, sem fundamento real.

4. Fútil.

5. Frívolo.

6. Vanglorioso.

7. Falso.

8. Ignorante.

9. Fantástico.

10. Ineficaz.

s. m.

11. Espaço vazio.

12. Abertura formada na parede por porta ou janela.

13. Jogo de tabuinhas ou de cortinas pertencente a uma porta ou a uma janela.

14. Bras. Norte Região clavicular; ápice do pulmão.

15. Bras. Goiás Vale, depressão entre montanhas.

Em vão: sem apoio, em falso; baldadamente, inutilmente.

 

ir  

v. intr.

1. Passar ou ser levado de um lugar para outro.

2. Caminhar, andar.

3. Voar.

4. Dirigir-se.

5. Decorrer.

6. Freqüentar.

7. Orçar.

8. Distar.

9. Seguir; levar.

v. pron.

10. Derramar-se.

11. Partir.

12. Morrer.

13. Acabar.

14. Correr, passar.

15. Evaporar-se; desvanecer-se.

 

 

Análise Literária realizada por Nilza Azzi e Dudu Oliveira.